MERCOSUR: Tribunal Arbitral – Controversia entre la República Oriental del Uruguay y la República Argentina – Laudo Arbitral “Prohibición de Importación de Neumáticos remoldeados” – Árbitros Hermes Marcelo Huck (Brasil), José María Gamio (Uruguay) y Marcelo Antonio Gottifredi (Argentina)

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Mercosul – Tribunal Arbitral

CONTROVÉRSIA ENTRE LA REPÚBLICA ORIENTAL DEL URUGUAY Y LA REPÚBLICA ARGENTINA PROHIBICIÓN DE IMPORTACIÓN DE NEUMÁTICOS REMOLDEADOS

LAUDO ARBITRAL Dr. Hermes Marcelo Huck Presidente,  Dr. José María Gamio Miembro, Dr. Marcelo Antonio Gottifredi Miembro – 25 de outubro de 2005

Laudo Arbitral

Na cidade de Montevidéu, República Oriental do Uruguai, aos 25 de outubro de 2005.

Laudo  prolatado pelo Tribunal Arbitral constituído para solucionar controvérsia surgida entre a República Oriental do Uruguai (aqui simplesmente denominada “Parte Reclamante” ou “Reclamante” ou Uruguai) e a República Argentina (aqui simplesmente denominada “Parte Reclamada” ou “Reclamada” ou “Argentina”), controvérsia essa versando sobre a “Prohibición de Importación de Neumáticos Remoldeados”.

I.-     RELATÓRIO 

A.-    O TRIBUNAL ARBITRAL 

  1. O Tribunal Arbitral, devidamente constituído para julgar a presente controvérsia, de conformidade com o disposto no Protocolo de Olivos, datado de 18 de fevereiro de 2002, é constituído pelos árbitros, Dr. Hermes Marcelo Huck da República Federativa do Brasil (Presidente do Tribunal), Dr. José María Gamio da República Oriental do Uruguai e Dr. Marcelo Antonio Gottifredi da República Argentina.
  1. O Presidente notificado de sua designação e o Tribunal constituído em data de 26 de julho de 2005, foi devidamente instalado aos 19 de agosto de 2005, na sede da Secretaria Administrativa do Mercosul, na cidade de Montevidéu, República Oriental do Uruguai. Em sessão do dia 19 de agosto de 2005, o Tribunal realizou sua primeira reunião, quando foram adotadas suas Regras de Procedimento. Foram as Partes convidadas a designar seus respectivos representantes e constituir domicílio na cidade de Montevidéu, onde funcionou o Tribunal, apresentar por escrito suas razões, bem como informar se aceitavam ou se opunham à intervenção de terceiros Estados Partes do Mercosul no procedimento arbitral.
  1. A Parte Reclamante, dentro do prazo que lhe foi concedido, apresentou  suas razões por escrito, tendo o Tribunal dado conhecimento das mesmas à Parte Reclamada; esta, igualmente no prazo que lhe foi concedido, apresentou sua contestação por escrito. Da contestação da Argentina foi dada ciência ao Uruguai. Igualmente, em cumprimento à determinação do Tribunal, as representações foram definidas e os domicílios para notificações indicados. O Uruguai nomeou como seus representantes os Doutores Hugo Cayrús Maurin, José María Robaina, Myriam Fraschini e o Engenheiro José Luis Heijo, tendo a Argentina indicado como seus representantes o Lic. Adrián Makuc (Titular) e o Ministro Daniel Raimondi (Substituto). As provas documentais apresentadas pelas Partes foram aceitas e delas dada ciência à outra Parte e posteriormente integradas ao Processo junto à Secretaria.
  1. Por manifestação escrita, datada de 30 de agosto de 2005, a Argentina informou não ter objeções à participação no processo arbitral de terceiros Estados Membros do Mercosul. Por manifestação escrita, datada de 01 de setembro de 2005, o Uruguai informou ao Tribunal que se opunha à participação de terceiros Estados no processo arbitral. Ficou, assim, excluída a participação de terceiros Estados na presente arbitragem.
  1. Por meio da Ordem Procedimental nº 4, de 21 de setembro de 2005, o Tribunal Arbitral, nos termos do disposto no artigo 16 do Protocolo de Olivos, prorrogou o prazo para prolação do laudo arbitral por mais 30 (trinta) dias, contados a partir de 26 de setembro de 2005.
  1. O Tribunal Arbitral convocou as Partes para a Audiência a celebrar-se na sede da Secretaria Administrativa do Mercosul, no dia 11 de outubro de 2005, às 09,30 horas, determinando que indicassem previamente as provas que pretendiam produzir no curso de tal Audiência. Pelo representante da Argentina foi pleiteado um adiamento da Audiência, tendo tal pleito sido rejeitado por força da Ordem Procedimental nº 6, pelas razões ali expostas, e mantida a realização da Audiência para a data previamente informada às Partes.
  1. Em nota de 06 de outubro de 2005, o Uruguai informou que faria prova pericial durante a Audiência, por meio da oitiva do Engenheiro Ricardo Leone. Em nota de 06 de outubro de 2005, a Argentina informou que ouviria na Audiência os peritos Dr. Jorge Mandelbaum, Lic. Liliana Rehak, Dra. Leila Devia e Dra. Raquel Turcán. Anexou a seu pedido os curricula dos peritos, bem como uma lista de perguntas que pretendia ver por eles respondidas. Argentina posteriormente solicitou fossem exibidos dois vídeos durante a Audiência.
  1. Em data de 11 de outubro de 2005, com início às 09,30 horas, realizou-se a Audiência designada. Foram ouvidos os depoimentos dos peritos indicados por ambas as partes, tendo se manifestado primeiramente o perito designado pelo Uruguai e posteriormente os peritos nomeados pela Argentina. O perito indicado pelo Uruguai apresentou uma série de considerações e de dados sobre a produção e funcionamento de pneus remoldeados, fazendo acompanhar sua exposição por uma exibição de slides pelo sistema power point. Posteriormente, respondeu a perguntas formuladas pelas Partes, bem como pelos árbitros. Os peritos nomeados pela Argentina depuseram em dois momentos distintos. De início, foram ouvidos os Dr. Jorge Mandelbaum e a Lic. Liliana Rehak, que responderam às perguntas previamente formuladas pela Argentina, bem como as postas pelos representantes do Uruguai e pelos árbitros. Versaram tais perguntas sobre aspectos técnicos da fabricação e uso dos pneus remoldeados. Em seqüência, foram ouvidos os peritos Dra. Leila Devia e Dra. Raquel Turcán, respondendo inicialmente a questões previamente formuladas pela Argentina e posteriormente as que lhes foram submetidas pelos representantes do Uruguai. Versaram tais perguntas sobre aspectos jurídicos da preservação do meio ambiente, do impacto ambiental causado pela disposição de pneus usados, bem como sobre medidas técnicas discutidas e adotadas para minimização desse problema. O representante da Argentina, após a oitiva dos peritos, fez exibir dois vídeos, sendo um relativo a matéria tele jornalística produzida no México e outro um comercial de televisão. O Tribunal considerou plenamente inteligíveis as provas apresentadas pelas Partes no curso da Audiência.
  1. Tal como disposto na Acta de Sessión nº 2, relativa à Audiência ocorrida no dia 11 de outubro de 2005, ata essa firmada pelos árbitros e pelos representantes das Partes, sem qualquer ressalva, os depoimentos dos peritos foram resumidos pela Secretaria do Mercosul e encaminhados às Partes para que apresentassem suas observações e sugestões relativamente ao texto resumido. Em 17 de outubro de 2005, as Partes apresentaram suas observações e sugestões ao texto-resumo dos depoimentos prestados pelos peritos que haviam deposto durante a Audiência. Tanto o resumo dos depoimentos, como as observações apresentadas pelas Partes integram o presente processo e complementam a citada Acta de Sessión nº 2.
  1. Encerradas as provas, as Partes apresentaram suas alegações orais. No prazo definido pelo Tribunal, as Partes submeteram as respectivas Alegações Finais, por escrito.

B.-    TRÂMITE PRÉVIO 

  1. O Tribunal Arbitral foi constituído de conformidade com o disposto no Protocolo de Olivos, tendo sido cumpridos todos os termos e condições nele estabelecidas para a solução de pendências. Anteriormente ao início do procedimento arbitral foram realizadas as gestões prévias destinadas à solução da controvérsia surgida entre as Partes, a saber:
  1. a)Na LVI Reunião Ordinária do Grupo Mercado Comum (GMC), realizada na cidade do Rio de Janeiro, Brasil, em 25 e 26 de novembro de 2004, o Uruguai informou sobre a possibilidade de por em prática o mecanismo de solução de controvérsias, em decorrência da proibição estabelecida pela Argentina, através da Lei nº 25.626, para a importação de pneus remoldeados.
  1. b)Através da Nota nº 2388/2004, o Uruguai solicitou o início de negociações diretas entre as Partes, nos termos dos artigos 4 e 5 do Protocolo de Olivos, propondo a realização de uma reunião entre as Partes na cidade de Belo Horizonte, onde se realizaria XXVIII Reunião Extraordinária do GMC. A Secretaria do Mercosul foi informada dessa proposta, por meio da Nota nº 2391/2004, de 06.12.2004, apresentada pelo Uruguai.
  1. c)A Argentina, por seu Coordenador Geral do GMC, respondeu com a Nota SCREI nº 888/2004, de 10.12.2004, acusando o recebimento da nota do Uruguai e propondo uma reunião bilateral, em data alternativa, a ser realizada na cidade de Buenos Aires.
  1. d)Referida reunião entre as Partes foi realizada no dia 23 de dezembro de 2004, na cidade de Buenos Aires. As Partes expuseram suas razões.
  1. e)Por manifestações recíprocas, as Partes discutiram alternativas para por fim à controvérsia, sem ter logrado chegar a um consenso quanto às diferenças.
  1. f)Sem ter chegado a uma solução para a controvérsia, o Uruguai, por meio da Nota nº 130/2005, de 23 de fevereiro de 2005, transmitiu à Secretaria do Mercosul que pretendia dar início ao procedimento arbitral, tal como previsto no Capítulo VI e seguintes do Protocolo de Olivos.
  1. Os procedimentos do Tribunal Arbitral foram registrados pela Secretaria Administrativa do Mercosul e desenvolveram-se em conformidade com o Protocolo de Olivos e as Regras de Procedimento aprovadas pelo Tribunal. As Partes apresentaram suas manifestações escritas e orais dentro da forma e prazos estabelecidos.
  1. Em conseqüência do acima exposto, nos termos do Capítulo VI do Protocolo de Olivos e demais legislação aplicável, este Tribunal Arbitral detém plena capacidade para emitir o presente LAUDO ARBITRAL, para cumprimento das Partes e para que produza todos os fins e efeitos de direito.

C.-    ALEGAÇÕES DAS PARTES  

  1. O pedido do Uruguai 
  1. Uruguai contesta a legitimidade da decisão da Argentina no sentido de proibir a importação de pneus reconstruídos. Afirma que havia normas administrativas que proibiam a importação de pneumáticos usados para a Argentina (posição 4012.20.00). Uma nota divulgada pela Dirección General de Industria (nº 89/2001), divulgada no SIM (Sistema Informático Maria) menciona que a anterior proibição de pneus usados prevista no artigo 38 do Decreto 660/00 também alcançava a pneus reconstruídos. Posteriormente, a Lei nº 25.626, de 09.08.2002, estende para todo o território nacional da Argentina a proibição da importação de pneumáticos e câmaras pneumáticas recauchutadas (posição 4012.10.00).
  1. Alega o Uruguai que, anteriormente a tal Lei, a proibição de importação restringia-se a pneus usados, mas era livre a importação de pneumáticos remoldeados, que se incluem na categoria de recauchutados. Assim, entre os anos de 1997 a 2001, as indústrias uruguaias produziram pneus remoldeados que foram exportados para a Argentina, sem qualquer restrição. Pela edição da Lei nº 25.626, a partir do primeiro trimestre de 2001, são suspensas as exportações de tais pneus remoldeados para a Argentina. Entretanto, posteriormente à vigência de tal Lei, importações de pneus recauchutados foram feitas pela Argentina de outros países, que não o Uruguai. Ressalta ainda o pedido inicial que a Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) tem posições aduaneiras distintas para pneus recauchutados (4012.11.00), pneus para ônibus e caminhões (4012.12.00), pneus de aeronaves (4012.13.00), demais pneus (4012.19.00) e para pneus usados (4012.20.00).
  1. A Lei contestada ao estender a proibição de importação aos pneus remoldeados ignorou as efetivas diferenças que existem entre tais pneus e os usados. Segundo a posição uruguaia, os pneus remoldeados não geram problemas de segurança de trânsito ou ao meio ambiente distintos dos problemas gerados por um pneumático novo.
  1. Alega que o uso de pneus remoldeados tem sido aconselhado inclusive nos países desenvolvidos e, após descrever o processo de remoldagem, traz conclusão do IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas da Universidade de São Paulo no sentido de que o pneumático remoldeado “possui, em princípio, as mesmas características do pneumático novo”. Refere ainda o pedido inicial à determinados testes técnicos que assegurariam a qualidade de tais pneus.
  1. Em seqüência, o pedido inicial do Uruguai comenta o artigo 50 do Tratado de Montevidéu, onde são enunciadas as hipóteses excepcionais, quando são autorizadas barreiras não-alfandegárias à importação de produtos pelos Estados subscritores. Analisa cada uma de tais hipóteses, argumentando que no caso dos pneus remoldeados não se pode falar em proteção à segurança (art. 50, inciso b), posto que esses produtos são seguros, tanto que a Argentina autoriza sua utilização pela frota nacional. Ademais, tais pneus são utilizados mundialmente, inclusive para guarnecer aeronaves, onde os requisitos de segurança são mais rigorosos. No tocante à hipótese de proteção à vida e saúde das pessoais, animais e vegetais (art. 50, inciso d), afirma que a durabilidade de um pneu remoldeado é idêntica a de um pneu novo, não havendo – portanto – impacto adicional ao meio ambiente. Ademais, existem na Argentina mais de 70 plantas industriais que produzem pneus reconstruídos, sendo os mesmos livremente utilizados pelos veículos argentinos.
  1. Após mencionar que a Decisión del Consejo del Mercado Común 70/00 – sobre Política Automotriz del Mercosur não abrange pneus remoldeados, o pedido do Uruguai lista uma longa série de medidas legislativas e administrativas de vários países do mundo, nos quais se admite o uso de pneus remoldeados.
  1. A demanda do Uruguai, a seguir, afirma que a proibição imposta pela Argentina à importação de pneus remoldeados viola os artigos 1º e 5º do Tratado de Assunção, por inibir injustificadamente a livre circulação de bens no âmbito do Mercosul. A modificação de condições pré existentes, a interrupção do fluxo comercial entre os países não são admissíveis no sistema do Mercosul, onde medidas sobre comércio de bens devem fundar-se em acordos que criem vínculos jurídicos e não em medidas unilaterais adotadas por seus membros. No mesmo sentido, argumenta o Uruguai, a proibição de importações adotada pela Argentina violaria o Anexo I do Tratado de Assunção, as Decisões nºs 22/00 e 57/00, relativas ao Acesso a Mercados, adotadas pelo Conselho do Mercado Comum.
  1. A edição da Lei argentina igualmente violaria, segundo o Uruguai, vários dispositivos de Direito Internacional, admitido como direito aplicável ao caso segundo o Protocolo de Olivos, tais como os pacta sunt servanda, o princípio da boa fé, consagrado pelo artigo 26 da Convenção de Viena de 1969, sobre Direito dos Tratados. Adiciona, ainda a sua argumentação, os princípios do Direito da Integração, tais como adotados no laudo arbitral editado em 09 de janeiro de 2002 sobre controvérsia análoga à presente que confrontou a República Oriental do Uruguai e os Estados Unidos do Brasil.
  1. Tendo analisado as normas e princípios do Direito Internacional, inclusive aqueles adotados e praticados no cenário do GATT e da OMC, a demanda uruguaia argumenta que, ao caso presente, é de ser aplicado o “princípio e norma internacional do estoppel”.
  1. Finalmente, o Uruguai pleiteia, ante todo o exposto, seja declarada pelo Tribunal Arbitral a incompatibilidade da Lei nº 25.626 da República Argentina com as normas e princípios vigentes no Mercosul, bem como com princípios e disposições de Direito Internacional e que, portanto, a República Argentina revogue referida Lei, bem como torne nulas todas as medidas de efeitos similares, abstendo-se de adotar no futuro outras medidas que tenham efeitos restritivos e/ou discriminatórios semelhantes aos questionados no presente feito.
  1. Contestação da Argentina 
  1. Em sua resposta, a Argentina rejeita a amplitude do objeto da arbitragem definida pelo Uruguai, pois ao solicitar que a decisão do Tribunal alcance outras medidas além da Lei nº 25.626, estaria incluindo no pleito pedido genérico, inespecífico e com alto grau de abstração.
  1. A contestação da Argentina retoma os antecedentes da divergência, mencionando proposta de acordo feita ao Uruguai e que não obteve deste a devida resposta. Relata as negociações bilaterais diretas havidas entre as Partes, bem como detalha referida proposta de acordo submetida ao Uruguai, no sentido de estabelecer-se um limite quantitativo de pneus remoldeados a serem importados pela Argentina do Uruguai, limite esse definido pelo número de pneus usados que o Uruguai importasse da Argentina. O Uruguai não concordou com a proposta de negociação assim formulada.
  1. Segundo a argumentação da Argentina, a Lei nº 25.626, caracterizada como uma proibição de caráter não-econômico, está amparada nas hipóteses elencadas pelo artigo 50 do Tratado de Montevidéu, recepcionado pelo Anexo I do Tratado de Assunção. A lei argentina não só está conforme com a legislação do Mercosul, como significa um passo adiante para alcançar-se o bem estar dos povos da região, através da proteção ao meio ambiente e à saúde das pessoas, animais e vegetais que habitam seu território.
  1. Argentina alega que a Lei em discussão é medida de caráter preventivo destinada a evitar o dano potencial que os pneus remoldeados, enquanto resíduos perigosos por sua difícil e onerosa disposição final, possam causar ao meio ambiente, à saúde das pessoas, animais e vegetais, comprometendo o desenvolvimento das gerações presentes e futuras. A contestação da Argentina confirma o reconhecimento e aceitação das normas que se destinam a promover o livre comércio no Mercosul, porém argumenta que o artigo 50 do Tratado de Montevidéu de 1980 garante amparo legal a suas pretensões.
  1. Segundo a Reclamada, a exceção ao livre comércio criada pelo artigo 50 do Tratado de Montevidéu e, mais especialmente seu inciso d) que fala da proteção à vida e à saúde das pessoas, animais e vegetais, foi reconhecida por Tribunais Arbitrais Ad Hoc, constituídos no âmbito do Mercosul, sob o marco do Protocolo de Brasília. A contestação da Argentina, nessa linha, comenta a decisão adotada em laudo arbitral que dirimiu controvérsia entre Argentina e Brasil.
  1. Assim, conclui a Argentina, a Lei nº 25.626 inclui-se entre as exceções previstas no artigo 50 do Tratado de Montevidéu, pois (a) o bem jurídico tutelado é a proteção à vida e saúde das pessoas, dos animais e dos vegetais; (b) o comércio de pneus remoldeados entre Argentina e Uruguai foi marginal e insignificante em face do total de exportações feitas do Uruguai para a Argentina e (c) não se aplica ao caso o princípio da proporcionalidade, pois quando está em jogo a vida, a saúde, o padrão de vida dos habitantes do país, bem como os recursos naturais existentes, seria impossível implementar uma medida de proporcionalidade.
  1. A seguir, a Argentina passa a discutir a existência de medidas de exceção ao livre comércio vigentes no âmbito multilateral e na União Européia. Nessa linha, discute em detalhe o artigo XX do GATT 1994, referindo-se a decisões adotadas pela Organização Mundial do Comércio, entendendo que, tal como exigido em tais decisões, a Argentina pode comprovar a compatibilidade da Lei restritiva adotada com o objetivo de preservar o meio ambiente, respeitados os princípios da não discriminação, da necessidade e da proporcionalidade, posto que, como argumenta, não seria possível alcançar tais objetivos com a adoção de outras medidas.
  1. A contestação apresentada pela Argentina analisa, na seqüência, o artigo 30 do Tratado de Roma, no qual também são reconhecidas exceções ao princípio do livre comércio, quando ditadas para preservação da saúde e da vida das pessoas e dos animais, bem como para a preservação dos vegetais. Refere ainda decisões jurisprudenciais adotadas com fundamento no citado artigo. Comenta as Decisões nºs. 22/00 e 57/00 do Conselho do Mercado Comum, reconhecendo que a primeira consagra o compromisso dos Estados Membros em não adotar medidas restritivas ao comércio recíproco. Entretanto, afirma que tal Decisão ratifica a exceção consagrada no artigo 2º, letra b) do Anexo I ao Tratado de Assunção. Analisa os argumentos apresentados no pedido inicial do Uruguai, em relação a tais Decisões, para refutá-los individualmente.
  1. Em seguida, a defesa argentina tece comentários sobre o Laudo Arbitral emanado da controvérsia sobre importação de pneumáticos remoldeados que envolveu Uruguai e Brasil, para afirmar que determinadas conclusões de tal Laudo são equivocadas e afastaram-se substancialmente da doutrina emanada de todos os Laudos arbitrais que anteriormente se haviam pronunciado sobre a matéria, no âmbito do Mercosul. O Laudo Arbitral mencionado não faz qualquer referência à exceção prevista no Tratado de Assunção, que remete ao artigo 50 do Tratado de Montevidéu de 1980. Argumenta a contestação que tal Laudo ignorou totalmente o caráter evolutivo da ciência, a tecnologia, o direito em geral, o direito ambiental particularmente, a saúde etc., tendo concluído que os Estados Partes estariam proibidos de restringir ou proibir o ingresso em seus territórios de produtos que, em determinado momento se comercializava sem restrições por desconhecimento de suas propriedades nocivas para a saúde humana ou prejudiciais ao meio ambiente.
  1. Afirma a defesa que as exceções ao livre comércio existem tanto no marco do Mercosul, como também na União Européia e na Organização Mundial de Saúde, concluindo que (a) é lícito e possível admitir-se a aplicação de medidas restritivas de caráter excepcional; (b) as medidas implementadas devem estar efetivamente destinadas a proteger bens de natureza superior ou valores não econômicos.
  1. Segue a contestação afirmando não haver qualquer discriminação na medida restritiva adotada, pois desde março de 2001, nenhum pneu reconstruído ingressou no território argentino de forma definitiva; a medida não caracteriza uma restrição encoberta ao comércio bilateral, porque o volume comercial de tal produto entre os dois países era insignificante; houve ofertas da Argentina para resolver amigavelmente a pendência, mediante a exportação temporária de pneus usados argentinos para o Uruguai, onde seriam remoldeados e assim retornariam ao território argentino; o objetivo da Lei nº 25.626 é o de manter controlado o “passivo ambiental” argentino, e não proteger o recauchutador nacional ou restringir o comércio, pois não fosse assim, não se teria proposto o acordo no qual constava a reconstrução de pneus no Uruguai.
  1.     Nos pontos seguintes, a defesa apresentada pela Argentina discorre longamente sobre o processo legislativo de que resultou  a aprovação da Lei nº 25.626, indicando que no debate parlamentar ficou claro que a medida destinava-se a prevenir o ingresso de resíduos disfarçados de mercadorias com vida útil comprometida ou esgotada, bem como os impactos ambientais, atuais ou latentes decorrentes de tais mercadorias, tendo em vista a complexidade de sua gestão e os elevados custos envolvidos. A defesa igualmente discorre sobre o princípio da prevenção em Direito Ambiental, assegurando o caráter de proteção ambiental da Lei contestada. Finalmente, relembra as preocupações com o meio ambiente reveladas nos documentos do Mercosul, particularmente no Preâmbulo do Tratado de Assunção. Ainda, sobre tais preocupações, menciona o Acordo Marco sobre Meio Ambiente do Mercosul, de 22 de junho de 2001, bem como o projeto de Gestão Ambiental de Resíduos e Responsabilidade Pós Consumo, ainda em discussão pelo Conselho do Mercado Comum.
  1.     Discorre a defesa sobre o passivo ambiental e pelos danos infringidos à saúde das pessoas e animais pelos pneus ao final de sua vida útil, pelos riscos decorrentes da queima de tais produtos, pelos perigos decorrentes da armazenagem a céu aberto, lembrando Diretiva do Parlamento Europeu (2000/53/CE) sobre a disposição de veículos, seus componentes e materiais, ao final de sua vida útil. Discorre sobre o fato de o Uruguai importar carcaças de países desenvolvidos fora da zona do Mercosul, concluindo que tal fato implica impacto negativo mediato em decorrência do curto período de reutilização do pneu remoldeado e da falta de soluções concretas para sua disposição final e efeitos sobre o meio ambiente.
  1. A contestação argentina refuta como não aplicável ao caso o princípio do estoppel, discorre sobre as nomenclaturas aduaneiras de produtos, indica dados estatísticos sobre o volume de importações argentinas de pneus recauchutados ou usados, indicando a participação do Uruguai nesse comércio. Relata também dados estatísticos do Uruguai, indicando o volume de importação de pneus usados por aquele país.
  1. A defesa apresentada pela Argentina procura refutar individualmente os argumentos apresentados pelo Uruguai em seu pedido inicial. Conclui sua defesa, argumentando que a Lei nº 25.626 é compatível com as normas do Mercosul; que tal Lei foi editada em cumprimento ao artigo 41 da Constituição Nacional da Argentina; que a preservação do meio ambiente e da saúde das pessoas, animais e vegetais é necessária para atingir-se aos objetivos do Mercosul; que a indigitada Lei tem fundamento no princípio da prevenção em matéria ambiental; que os princípios do livre comércio e da proteção ao meio ambiente integram igualmente as normas do Mercosul; que os pneus remoldeados no Uruguai utilizam-se de carcaças importadas de países desenvolvidos e tendo vida útil reduzida podem converter a região em “lixeira de resíduos importados e potencialmente perigosos; vários países da região, tais como Chile, Peru e Equador, adotaram normas que proíbem a importação de pneumáticos usados e/ou recauchutados; a Argentina mantém como política a proteção do meio ambiente; o princípio de livre comércio é relativizado pelo Tratado de Assunção ao admitir as exceções do artigo 50 do Tratado de Montevidéu.
  1. Por força do raciocínio apresentado, a Argentina entende que a Lei atacada é excepcional, tem caráter de proporcionalidade, não é discriminatória, destina-se a proteger um dos valores enumerados no artigo 50 do Tratado de Montevidéu, e não se dispõe de alternativa menos restritiva ao comércio intra-zona.
  1. A Argentina requer ao final de sua defesa que se declare a norma questionada pelo Uruguai como compatível com as determinações do Tratado de Assunção e de seu Anexo I, bem como com as normas insculpidas no mesmo e com as disposições de Direito Internacional aplicáveis à matéria.
  1. FUNDAMENTOS PARA A DECISÃO
  1. Tendo presentes os argumentos trazidos pelas Partes, bem como as provas realizadas durante o curso da arbitragem, o Tribunal Arbitral, bem ponderando os fatos e o direito trazidos a seu conhecimento e análise, baseia sua decisão, ao final prolatada, nos argumentos já analisados, bem como, dentre outros, nos fundamentos e considerações de fato e de direito a seguir expendidos.
  1. Objeto da  Controvérsia
  1. O Uruguai define o objeto da controvérsia posta perante este Tribunal como sendo a Lei nº 25.626 da República Argentina, promulgada em 08 de agosto de 2002 e publicada no Boletín Oficial, no dia 09 de agosto de 2002, que proíbe a importação de determinados produtos, entre os quais se encontram aqueles incluídos na Nomeclatura Comum do Mercosul, individualizados e classificados no Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias, sob o NCM 4012.10.00 Pneumáticos (câmaras pneumáticas) recauchutados (entre os quais se incluem os pneumáticos remoldeados). Igualmente, o Uruguai entende incluir-se no objeto da controvérsia toda medida similar da República Argentina com efeito restritivo ou discriminatório relativa à importação do Uruguai dos referidos produtos.           
  1. Considerando que a definição do objeto do litígio apresentada pelo Uruguai mantém características de generalidade, inespecificidade e apresentar determinado grau de abstração, a Argentina refuta tal definição, pretendendo ver restrito o objeto da demanda tão-somente á Lei nº 25.626, acima mencionada e que se encontra em vigor desde o dia 17 de agosto de 2002.
  1. Nos termos do disposto no artigo 14 do Protocolo de Olivos, o objeto da controvérsia é determinado pela apresentação do pedido e sua respectiva resposta ao Tribunal Arbitral, não se admitindo alterações posteriores. As alegações feitas pelas Partes no pedido e na contestação devem estar vinculadas nas questões que tenham sido consideradas em etapas prévias à arbitragem, etapas essas previstas no próprio Protocolo e no Anexo ao Protocolo de Ouro Preto. Fica, portanto, delimitado o objeto da controvérsia pela simples verificação dos termos constantes do pedido e da resposta das Partes litigantes, bem como das provas do que foi discutido em etapas de negociação anteriores ao início do procedimento arbitral.     
  2. Os termos de discussão anteriores à arbitragem podem ser conhecidos pela análise dos documentos trazidos aos autos pelas Partes, quando atenderam ao disposto na Ordem Procedimental nº 1, de 23 de agosto de 2005, que determinou fossem juntados ao processo, junto a Secretaria do Mercosul, “todos os documentos relativos à presente controvérsia, inclusive a troca de correspondência eletrônica ou epistolar – em poder de cada parte – que tenham sido produzidos durante o processo de negociação ocorrido previamente à apresentação pela República Oriental do Uruguai do requerimento para a instalação deste Tribunal Arbitral”.
  1. Ainda que os documentos produzidos pelas Partes anteriormente à instalação do Tribunal Arbitral não sejam abundantes, de seu exame e leitura, cotejados com os escritos apresentados já durante a fase arbitral, não é difícil a definição do objeto do litígio.
  1. Durante todas as negociações e discussões havidas entre as Partes, ficou claro o embate entre dois princípios consagrados pelas normas do Mercosul e pelo Direito Internacional. De um lado, o princípio da livre circulação de mercadorias no Mercosul, sustentado no banimento de barreiras não-econômicas ao comércio entre os Estados Membros; de outro lado, as normas que garantem a preservação do meio ambiente e da saúde das pessoas, animais e vegetais da zona. Nessa discussão, o ponto fulcral concentra-se na Lei nº 25.626, editada pela Argentina, em 08 de agosto de 2002, que proíbe a importação de pneumáticos remoldeados, estendendo a estes a proibição já existente para pneumáticos usados. O Uruguai insurge-se contra tal Lei, pois entende que seu conteúdo é contrários às normas do Mercosul, na medida em que restringe injustamente o comércio, interrompendo um fluxo comercial de pneus remoldeados produzidos no Uruguai e que vinham sendo exportados para a Argentina.
  1. Pontos incontroversos
  1. No curso do procedimento arbitral, alguns pontos levantados e discutidos pelas Partes ficaram incontroversos. Em primeiro lugar, constatou-se que havia um fluxo comercial de pneus remoldeados exportados do Uruguai para a Argentina. Esse fluxo, intermitente e de proporções econômicas modestas, perdurou pelo período compreendido entre 1997 e 2001, ou seja por cerca de quatro anos. Tal fluxo comercial foi interrompido, ao final de 2001, em decorrência da edição da Lei nº  25.626, de 2002, pela Argentina, que estendia a proibição de pneus usados a pneus remoldeados. Por força dessa norma a livre circulação de bens foi afetada, no âmbito do Mercosul. Ficou comprovada haver clara distinção entre os pneus remoldeados e os demais pneus reconstruídos (recapados ou  simplesmente recauchutados). As provas produzidas por ambas as partes deixaram claro que os pneus remoldeados são razoavelmente seguros, não havendo indicações de acidentes produzidos especificamente por tais produtos. A despeito de haver consenso quanto a segurança de tais pneus, pois são livremente utilizados em ambos os países, as Partes não acordaram quanto a durabilidade dos mesmos. Há no processo indicações de que um pneu remoldeado pode durar entre 30% e 100% do prazo de vida útil de um pneu novo. É, porém, fato igualmente inconteste que um pneu para automóvel pode ser remoldeado uma única vez. As Partes não divergiram quanto ao impacto ambiental que causam os pneus quando usados e inservíveis. Tornou-se fato incontroverso que não se dispõe de tecnologia adequada e economicamente viável para a reciclagem de pneus usados e inutilizados. Finalmente, as Partes declararam-se adeptas do princípio do livre comércio no Mercosul, e preocupadas com os problemas do meio ambiente e da saúde das pessoas, dos animais e da preservação dos vegetais que ocupam a zona do Mercosul.
  1. Direito aplicável
  1. Os Tribunais Arbitrais Ad Hoc instituídos na forma prescrita pelo Protocolo de Olivos, nos precisos termos do artigo 34 desse mesmo Protocolo, devem decidir as controvérsias a eles submetidas com base no Tratado de Assunção, no Protocolo de Ouro Preto, nos protocolos e acordos celebrados no marco do Tratado de Assunção, nas Decisões do Grupo Mercado Comum, nas diretrizes da Comissão de Comércio do Mercosul e nos princípios e disposições de Direito Internacional aplicáveis à matéria em julgamento. Referido artigo ainda permite o julgamento por equidade, se a Partes envolvidas na arbitragem assim acordarem.
  1. No presente caso, não houve acordo para que o Tribunal pudesse decidir ex aequo et bono, devendo ser aplicado, portanto, o direito tal como especificado no item 1 do referido artigo 34 do Protocolo de Olivos, o que é feito pelo Tribunal. Destarte, a aplicação de normas do sistema do Mercosul, bem como sua interpretação, serão procedidas contra o pano de fundo dos princípios e disposições do Direito Internacional. Para espancar quaisquer dúvidas, desde logo, o Tribunal entende como direito aplicável aquele instituído nos documentos firmados no marco do Mercosul, bem como regulamentos e anexos que integram tratados, protocolos, acordos, decisões e diretrizes.
  1. Os princípios jurídicos em confronto 
  1. O artigo 1º do Tratado de Assunção estabelece como primeira condição basilar para o estabelecimento do Mercosul a adoção do princípio da livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre os países, através, entre outros, da eliminação dos direitos alfandegários, restrições não-tarifárias à circulação de mercado e de qualquer outra medida de efeito equivalente.
  1. Ainda que mencionando outros fundamentos legais igualmente pertinentes, o pedido do Uruguai estabelece sua principal base legal na violação pela Argentina do princípio da livre circulação de bens no território do Mercosul. Assim, reside no referido artigo 1º do Tratado de Assunção, ou seja na violação da regra essencial em que deve se assentar o Mercado Comum, o inconformismo do Uruguai, retratado em todas suas manifestações perante este Tribunal Arbitral.
  1. A Argentina, de seu lado, em nenhum momento contesta tal princípio, ressaltando seu comprometimento com as regras que garantem a livre circulação de bens na zona integrada, livre de restrições ou discriminações. Contrapõe, entretanto, ao pedido do Uruguai, as exceções legais e legítimas à livre circulação de bens. Chama a Argentina a seu favor, dentre outros fundamentos, o Preâmbulo do Tratado de Assunção, quando admite que o processo de integração e desenvolvimento econômico com justiça social passa também e necessariamente pela preservação do meio ambiente. Busca, ainda, fundamento no Anexo I ao Tratado, quando em seu artigo 2º, letra b), exclui do conceito de “restrições ao livre comércio” as situações previstas no artigo 50 do Tratado de Montevidéu de 1950. Deste artigo 50, a Argentina destaca a letra b), relativa à aplicação de leis e regulamentos de segurança, e a letra d), pertinente à proteção da vida e saúde das pessoas, dos animais e dos vegetais.
  1. De sua parte, o Uruguai revela não discordar das medidas de proteção ambiental, expondo o conjunto de normas vigentes internas relativas a tal matéria, bem como sua atuação internacional no sentido de proteger os valores ambientais. Destaca, entretanto, que a fundamentação legal trazido pela Argentina é inaplicável ao caso dos pneus remoldeados.
  1. Destarte, o Tribunal defronta-se com argumentos das Partes que implicam verdadeiro confronto entre princípios norteadores do Mercosul. Tendo este Tribunal admitido ser ponto incontroverso a decisão argentina de proibir a importação de pneus remoldeados para seu território, bem como que tal proibição atingiu determinado fluxo de comércio originado do Uruguai, a decisão a ser adotada levará em consideração os fatos concretos que caracterizaram o fluxo de comércio de pneus remoldeados do Uruguai para Argentina, mormente no período de 1997 a 2001. Ponderará ainda o Tribunal a aplicação dos mencionados princípios em confronto, ou seja, o livre comércio e a proteção do meio ambiente, definindo a prevalência de um sobre o outro, tendo em conta os ditames do Direito Internacional e, muito especialmente, as peculiaridades do caso sub examen.
  1. O direito e o caso concreto
  1. Tendo as Partes ratificado seu convencimento quanto à legalidade da aplicação do princípio da livre circulação de bens na região,  bem como admitido o fato de que determinada Lei interna argentina proibiu a importação de produtos que vinham sendo exportados pelo Uruguai, cabe a este Tribunal definir se a exceção apresentada pela Argentina, ou seja – em termos gerais – se a proteção da saúde e vida de pessoas e animais e a preservação do meio ambiente, tem condições jurídicas de se opor ao princípio do livre comércio, em determinadas condições e/ou circunstâncias.
  1. Além das normas e princípios antes citados, têm referência direta com o caso concreto ora em análise, toda uma série de dispositivos internacionais, levantados pelas Partes no curso das discussões. Note-se, em primeiro lugar, o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT) que dispõe em seu artigo XX que os Estados membros (Argentina e Uruguai são membros) podem estabelecer restrições às importações por motivos não-econômicos desde que, como estatuído na letra “b”, sejam necessárias para proteger a saúde e a vida das pessoas e dos animais ou para preservar os vegetais. O Tratado de Assunção, como visto, incorporou tal exceção ao princípio do livre comércio, como antes mencionado.
  1. O Preâmbulo do Tratado de Assunção consagra como um dos instrumentos do processo de integração a “preservação do meio ambiente”. Note-se, ademais, que se entende como objetivo do Tratado o fim último da melhoria das condições de vida dos habitantes da região. Oportuno lembrar que, nos termos do artigo 31.2 da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, a interpretação de um tratado há de levar em conta seu contexto, o qual compreende o texto, o preâmbulo e os anexos.
  1. O Conselho do Mercado Comum, pela DEC nº 2/01, no âmbito do Acordo Marco sobre o Meio Ambiente do Mercosul, revela direta preocupação com o tema da preservação do meio ambiente quando menciona a necessidade da melhorar a qualidade ambiental da região através de um marco jurídico para regulamentar as ações de proteção ao meio ambiente e à conservação dos recursos naturais dos países membros do Mercosul. O Acordo Marco sobre o Meio Ambiente, já aprovado por Argentina e Uruguai, estabelece como suas finalidades, dentre outras, a promoção da proteção ao meio ambiente, a promoção do desenvolvimento sustentável, o tratamento prioritário e integral das causas e fontes de problemas ambientais, o fomento à internalização dos custos ambientais. Importante salientar que o artigo 3º do Acordo Marco, no qual se incluem as finalidades aqui mencionadas, revela preocupação com o possível choque de medidas ambientais com o fluxo do livre comércio. Com efeito, na letra c), deste artigo 3º, destaca como seu objetivo a “promoção do desenvolvimento sustentável por meio de apoio recíproco entre os setores ambientais e econômicos, evitando a adoção de medidas que restrinjam ou distorçam, de maneira arbitrária ou injustificada, a livre circulação de bens e serviços no âmbito do Mercosul”.
  1. Verifica-se, portanto, que no Acordo Marco, o legislador já anteviu a possibilidade de medidas de caráter ambiental afetando o livre comércio da região, tendo recomendado que se evitasse a adoção de medidas restritivas injustificadas ou de caráter arbitrário. A contrario sensu, é possível admitir-se que o mesmo legislador considerou legítimas determinadas medidas de proteção ambiental que, de forma justificada e não-arbitrária, possam afetar o livre comércio da região.
  1. No mesmo sentido, a Declaração do Rio de Janeiro sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, firmada em 1992, que ostenta seus objetivos a proteção da integridade do sistema ambiental e do desenvolvimento mundial, admite em um de seus princípios (Princípio 4) que a proteção do meio ambiente deve constituir parte integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser considerada de formada isolada. Vale dizer que Estados representando a quase totalidade da população mundial presentes à Conferência do Rio, conhecida como Eco-92, admitem na Declaração final que o tema do meio ambiente deverá sempre ser analisado em conjunto com outros temas vinculados ao desenvolvimento dos povos. Mais adiante, a mesma Declaração, em seu Princípio 12, determina que as medidas de política comercial com fins ambientais não devem constituir-se em meio de discriminação arbitrária ou injustificada, nem em restrição velada ao comércio internacional. Tal como no Acordo Marco do Mercosul, a Declaração do Rio reconhece o perigo da utilização dos temas do meio ambiente como forma de proteção comercial ou de restrição ao livre comércio, mas admite o emprego restritivo dessas medidas, desde que de forma justificada e não arbitrária. Para complementar as referências à Declaração de 1992 sobre o meio ambiente, cumpre recordar que a mesma consagrou a aplicação do critério de precaução, quando em discussão questões de meio ambiente, admitindo que quando houver perigo de dano grave ou irreversível ao meio ambiente, a falta de certeza científica não deve servir como motivo para a não-adoção das medidas julgadas necessárias.
  2. Em matéria de direito, o Uruguai traz igualmente à luz as Decisões nºs. 22/00 e 57/00 do Conselho do Mercado Comum. A Decisão CMC 22/00 insere-se no processo denominado de “Relançamento do Mercosul”. Seu ponto fundamental reside na reafirmação do princípio da livre circulação de bens no território regional, como base da consolidação de um mercado comum. O objetivo da decisão é o de “acordar um plan de trabajo para el tratamiento de tales medidas, com miras a la eliminación de las dificultades que las mismas ocasionam em las corrientes entre los Estados Partes”.  Nessa linha, o artigo 1º da Decisão ratifica a determinação de que nenhum Estado Parte pode adotar qualquer medida restritiva ao comércio recíproco. Faz entretanto, tal artigo, expressa ressalva ao previsto no artigo 2º, letra b) do Anexo I ao Tratado de Assunção, que remetendo ao artigo 50 do Tratado de Montevidéu de 1980, estabelece determinadas exceções para a adoção de medidas restritivas ao livre comércio. Já em seu artigo 3º, a Decisão CMC 22/00 determina ações tendentes a eliminar as dificuldades geradas no comércio intra-zona ou para eliminar as medidas restritivas ao comércio justificadas pelo art. 50 do Tratado de Montevidéu. Vale dizer que a Decisão ao mesmo tempo em que ratifica o princípio de um comércio livre e sem restrições, aceita aquelas fundamentadas na exceção do art. 50 do Tratado de Montevidéu e estabelece procedimentos para a eliminação de tais medidas restritivas, a serem adotadas no curso do tempo.
  3. De seu lado, a Decisão CMC 57/00 objetiva complementar a anterior Decisão 22/00. Fica explícito em seu texto que o livre comércio de bens constitui elemento essencial para a confirmação do mercado comum definido no Tratado de Assunção. Da mesma forma indica a necessidade de assegurar princípios fundamentais de proteção à vida e à segurança pública, e as medidas que com essa finalidade não devam gerar obstáculos desnecessários ao comércio. Evidencia-se, assim, que o processo de relançamento do Mercosul, corporificado inclusive nas Decisões do Conselho do Mercosul, acima mencionadas, ratifica seu compromisso com o livre comércio entre os Estados Partes, livre de restrições ou barreiras não-tarifárias, mas igualmente preserva as exceções já previstas em documentos anteriores.
  4. A matéria ambiental transformou-se em tema prioritário entre as nações do mundo e, não poderia ser diferente entre os membros do Mercosul. Além das normas já analisadas, vale lembrar outras tantas que, no marco regional, tratam diretamente do tema, a saber: (a) A CMC/DEC nº 2/94, sobre o Acordo de Transporte de Mercadorias Perigosas; (b) a decisão GMC 10/94, que trata das Diretrizes Básicas em Política Ambiental; (c) a CMC/DEC nº 10/00 sobre a Complementação do Plano Geral de Cooperação e Coordenação Recíproca para a Segurança Regional, em matéria de Ilícitos Ambientais; (d) a CMC/DEC nº 19/03, relativa à Reunião de Ministros do Meio Ambiente, com a finalidade de criar a “Reunião de Ministros do Meio Ambiente”, que terá como função propor ao Conselho do Mercado Comum medidas destinadas à coordenação de políticas para promover a gestão ambiental e o desenvolvimento sustentável nos países do Mercosul, assim como ações de cooperação e articulação em matéria de meio ambiente entre os Estados Partes; (e) a CMC/DEC nº 14/04, que aprova o Protocolo Adicional ao Acordo Marco sobre Meio Ambiente do Mercosul em Matéria de Cooperação e Assistência frente a Emergências Ambientais.
  1. Limites ao Direito da Integração
  1. A disposição política dos países que compõem o Mercosul na busca  da integração regional tem oscilado no curso dos anos, desde a assinatura do Tratado de Assunção. Contingências e circunstâncias específicas ditam os ventos favoráveis e, por vezes, menos favoráveis à consolidação e aprimoramento dessa zona comercial integrada. Entretanto, se a temperatura política tem variado, o mesmo não se pode dizer da coerência e consistência do sistema legislativo que instrumenta o Mercosul. Os Estados Membros respeitam e fazem respeitar as normas vigentes; há um incessante trabalho de aperfeiçoamento de normas e sistemas do processo de integração; há uma constante preocupação com a solução de eventuais controvérsias surgidas entre os membros, sendo o Protocolo de Olivos o melhor testemunho dessa afirmação.
  2. Os princípios da integração são reconhecidos por todos os membros do Mercosul, tendo sido inclusive ratificados por diversas manifestações de Uruguai e Argentina em vários momentos deste processo arbitral. Fundada no livre comércio, sem restrições ou barreiras, a sistemática jurídica da integração igualmente convive com os princípios da proporcionalidade, da limitação de reserva de soberania, da razoabilidade e da previsibilidade comercial. Por certo, a busca da integração e a consagração de seu fundamento no livre comércio só podem ter sentido como instrumentos de implementação do bem estar dos seres humanos que vivem na região. Leia-se bem estar como um conceito amplo, que implica todos os elementos que contribuem para aprimorar a qualidade de vida dos homens. Nesse quadro, a integração e o livre comércio não podem gozar de prioridade absoluta, posto que instrumentos do bem estar humano e não fins em si mesmos. O conceito de um mercado livre de barreiras deve ser temperado com outros princípios, igualmente consagrados pelo Direito, tais como a eficiência, a cooperação entre os povos, a preservação do meio ambiente, a prevenção, a precaução, dentre outros.
  3. De primeiro, há um intuito comum na formulação de políticas incrementadoras da melhor distribuição de recursos econômicos e naturais disponíveis, bem como dos recursos adicionais decorrentes do desenvolvimento econômico. Destinam-se tais políticas à eliminação de barreiras que prejudiquem o fluxo comercial e os investimentos realizados em países em desenvolvimento; à transferência de tecnologia, inclusive para o tratamento de problemas ambientais internos; ao desenvolvimento da capacidade dos países em criar e aprimorar tecnologias próprias, inclusive de preservação ambiental; à integração de políticas econômicas, ambientais e sociais, dentre outras finalidades. Nesse cenário, o princípio da eficiência impõe uma distribuição racional de recursos e propõe-se a garantir que os custos envolvidos no processo de integração efetivamente sirvam para incrementar um regime de comércio desenvolvido e competente.
  4. O princípio da cooperação internacional exige que os regimes comerciais em desenvolvimento promovam vínculos entre fronteiras, buscando o aperfeiçoamento  dos sistemas internacionais de cooperação. A cooperação regional deve desempenhar papel fundamental no desenvolvimento da capacidade de cada país incluído na região para gerenciar seus problemas ambientais. A cooperação e o apoio recíproco entre políticas econômicas e ambientais é essencial para o desenvolvimento seguro e sustentável da região. De seu lado, o princípio da integridade ambiental consagra que a falta de certeza científica não pode ser utilizada como motivo ou justificativa para postergar a adoção de medidas eficazes tendentes a evitar possíveis ou potenciais danos ao meio ambiente.
  5. Em consonância com o princípio da integridade ambiental, o princípio da precaução determina que o poder público se utilize de critérios científicos objetivos que conduzam ao equilíbrio entre a tomada de decisões para resultados a longo prazo e a satisfação de necessidades de curto prazo. Deve haver uma permanente integração entre a formulação de políticas ambientais e a pesquisa científica. A ciência funciona como colaboradora essencial para justificar medidas de proteção ao meio ambiente e serve como base para o desenvolvimento de políticas ambientais. É certo, entretanto, que o conhecimento científico sobre determinados ecosistemas e as conseqüências da ação do homem sobre a natureza é ainda incipiente e precário. Não se culpe a ciência por tal atraso, pois a efetiva e disseminada preocupação com a defesa e preservação do meio ambiente e dos recursos naturais surge apenas na segunda metade do século 20. A chamada incerteza científica deve ser ponderada na discussão de medidas e políticas destinadas ao meio ambiente. É senso comum que a ciência nem sempre é capaz de oferecer as provas necessárias para aferir-se – com certeza– os efeitos potenciais ou futuros que determinada atividade humana pode causar ao meio ambiente. Assim, forçoso é admitir a necessidade de incorporação dessa “incerteza científica” como componente de políticas ambientais.
  6. O princípio da precaução é corolário da constatação da incerteza científica face à necessidade inquestionável do implemento de políticas ambientais. A precaução determina que o objetivo de proteção ao meio ambiente não pode ser prejudicado pela falta de certeza científica. A fragilidade e a vulnerabilidade da natureza são realidades incontestes e os limites humanos da ciência não podem servir de justificativa para adiar a proteção do meio ambiente. Não sendo a incerteza científica um óbice para a tomada de medidas de precaução e defesa, procedeu-se a uma inversão do ônus da prova, de sorte a incumbir à parte que pretenda implantar uma atividade considerada nociva ou potencialmente perigosa ao meio ambiente provar que a mesma é segura e não constitui perigo ecológico. Nessa linha de conduta, as certidões de incerteza científica, por si só, podem justificar a adoção de medidas de resguardo ao ambiente. Por fim, a prevenção vem consagrada pelo moderno direito internacional e particularmente pelas normas do Mercosul, incluída que está no Acordo Marco do Meio Ambiente. Tal princípio consiste na autorização para a tomada de medidas destinadas a evitar e prevenir riscos potenciais.
  1. A prova produzida pelas Partes 
  1. As Partes submeteram a este Tribunal Arbitral um conjunto probatório amplo e bem elaborado. Foram documentos, dados estatísticos, gráficos, considerações técnicas, além da apresentação e oitiva de peritos feitas no curso da Audiência do dia 11 de outubro de 2005. Como já se teve oportunidade de mencionar, vários aspectos fáticos, objeto das referidas provas, tornaram-se incontroversos.
  2. Não há divergência entre as Partes a respeito da distinção existente entre um pneu novo, um pneu usado e um pneu remoldeado. Deixa-se de lado a análise de outros tipos de reconstrução de pneumáticos, pois a pendência gira exclusivamente em torno dos remoldeados. A prova trazida ao processo indica que o pneu remoldeado é um produto que se utiliza de uma carcaça de pneu usado, devidamente inspecionada e que esteja em bom estado, sobre a qual se reconstrói o pneu, abrangendo essa reconstrução a banda de rodagem, os ombros e as laterais do pneu.
  3. Quanto a segurança para o usuário de um pneu remoldeado,  ainda que as Partes possam ter discordado em algumas particularidades do tema, as provas indicam que tal tipo de produto não traz insegurança em seu uso no tráfego normal. Relata-se que esse processo de reconstrução é utilizado em pneus para caminhão e, especialmente, para aviões, o que indica a confiabilidade do mesmo. Ademais, a Argentina produz e admite o uso em seu território de pneus remoldeados, havendo – segundo se afirmou no processo – dezenas de indústrias trabalhando nessa fabricação. Assim, o fato da Argentina admitir o uso em seu território nacional de produtos ali reconstruídos elimina, para os efeitos deste processo, a necessidade de maior discussão quanto a segurança do produto.
  4. Entretanto, no aspecto da durabilidade, não houve acordo entre as Partes. O Uruguai apresentou conclusões técnicas do IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas, vinculado a Universidade de São Paulo, que através de um informativo datado de 24 de novembro de 1997 (nº 7.067), conclui que um pneumático reformado “é um pneumático remanufaturado através de um processo industrial que utiliza a estrutura íntegra dos pneumáticos usados, após uma rigorosa inspeção. (….) O pneumático assim obtido possui, em princípio, as mesmas características do pneumático novo, tendo inclusive que atender aos requisitos exigidos para pneumáticos novos, de acordo com as normas brasileiras. Dessa forma, adequadamente fabricado, o pneumático remoldeado tem a mesma durabilidade e seria tão ou mais seguro que um pneumático novo, utilizado nas mesmas condições” (vide Anexo nº 33, do pedido do Uruguai. Grifos nossos).
  5. Em contrapartida, a Argentina trouxe manifestação do Instituto Nacional de Tecnologia Industrial – INTI, na qual declara que a duração “de um neumático reconstruído depende de su tamaño y del modo em que fue usado. Lo que está claro es que la probabilidad de falla del mismo es mucho mayor que la de um numático nuevo por el envejecimiento que tiene la carcasa (neumático usado sobre el que se realiza la reconstrucción). (……) El rendimiento se estima, con base más práctica que técnica en un 30% de la vida útil de un neumático nuevo, pero depende mucho del estado del neumático usado en el momento de la selección y de la calidad del proceso de reconstrucción”. (vide Anexo 7.1, da contestação da Argentina. Grifos nossos).
  6. Além da divergência apresentada pelos dois institutos técnicos no tocante à durabilidade dos pneus remoldeados, as Partes trouxeram para o Tribunal Arbitral uma discussão técnica sobre resistência à abrasão de tais produtos. Uruguai apresentou um Informe de Ensayo sob o nº 878467/CUE, de responsabilidade do LATU – Laboratorio Tecnológico do Uruguai, relativo aos resultados de um experimento de resistência à abrasão dos pneus remoldeados em comparação com novos, realizado segundo a norma DIN 53516. O resultado é expresso pela medida de volume de borracha perdida pelos pneumáticos utilizados durante os testes. No caso dessa experiência, o LATU utilizou-se de um pneu novoCEAT e de um pneu remoldeado RALF, tendo concluído que, após os testes com ambos, o pneu CEAT (novo) perdeu 157 mm3 de borracha e o pneu RALF (remoldeado) sofreu uma perda de 145mm3. Pela diferença pouco significativa de desgaste entre ambos os produtos testados, conclui o LATU que a vida útil de um pneu RALF remoldeado é similar a de um pneu CEAT novo. (vide Anexo 27, do pedido do Uruguai).
  7. Sobre os testes realizados pelo LATU e respectivas conclusões, o INTI manifestou-se, opinando que “la medición del desgaste de la banda de rodamiento de los neumáticos se realiza a través de prolongadas pruebas em flotas de autos, camiones, entre otras, en los que se mide la disminuición de la profundidad de la banda de rodamiento (desgaste) a lo largo de miles de kilómetros. (…) El ensayo de abrasión según la norma DIN 53516 no es suficiente por sí mismo para garantizar la equivalencia de los compuestos para banda de rodamiento. En general, con un único ensayo es imposible concluir que dos compuestos de caucho son equivalentes. El ensayo de abrasión antes señalado compara desgaste por frotamiento en condiciones controladas, pero su correlación con las condiciones de servicio es muy pobre”. (vide Anexo 7.1, da contestação da Argentina).
  8. Da mesma forma, não foram conclusivos os depoimentos prestados pelos peritos de ambas as Partes no que se refere à durabilidade dos pneus remoldeados. Recorde-se que, nos depoimentos dos peritos indicados pela Argentina, Dr. Jorge Mandelbaum e Lic. Liliana Rehak, também  não conseguiram eles ser precisos quanto ao tema. Perguntados sobre a durabilidade do produto referida pelo INTI, afirmaram que não se trata de que durem cerca de 25% a 30% de um pneu novo, e sim que apresentam problemas estruturais antes inclusive que se desgaste a nova banda. (vide depoimento dos peritos Mandelbaum e Rehak).
  9. Restou afinal, comprovado que um pneu remoldeado é praticamente tão seguro em seu uso quanto um pneu novo. Que um pneu remoldeado tem durabilidade entre 30% e 100% de um pneu novo. Que um pneu remoldeado é mais barato do que pneu novo. Que um pneu remoldeado não pode ser novamente remoldeado.
  10. Neste ponto, são necessárias considerações sobre a prova realizada no tocante aos danos ambientais produzidos pelos pneus usados, quando transformados em resíduos. As alegações trazidas ao processo, os documentos juntados pela Argentina e, ainda os depoimentos das peritas indicadas, Dra. Leila Devia e Dra. Raquel Turcán, não foram contestados em seu fundo pelo Uruguai. Ademais, parece estanque de dúvidas que, ao final de sua vida útil, sejam pneus novos, sejam pneus remoldeados, tais produtos causam ou podem causar dano ao meio ambiente e, particularmente à saúde das pessoas, dos animais e a preservação dos vegetais. Um pneumático, ao fim de sua vida útil, não dispõe ainda de um processo de reciclagem economicamente viável, a despeito dos vários estudos que mundialmente são realizados nesse sentido. Um pneu, ao fim de sua vida útil, transforma-se em resíduo indesejável e potencialmente perigoso. Os pneus inservíveis podem ser armazenados ao ar livre, transformando-se em fonte de contaminação e verdadeiros criadouros de insetos. Além dessa conseqüência, podem tais resíduos liberar elementos de sua composição danosos à saúde de seres vivos e à natureza, inclusive contaminando as águas. Podem também os pneus ao fim de sua vida útil ser despejados em aterros sanitários, especialmente reservados para tal finalidade. Armazenados no subsolo, estima-se que tais produtos levem cerca de 500 anos para degradar-se na natureza. Nesse período, os aterros que recebem pneus inservíveis podem, com a liberação do processo de degradação, poluir gravemente o lençol freático, atingindo as águas subterrâneas, com conseqüências danosas para o meio ambiente.
  11. A posição do Uruguai, durante o curso do processo, foi – na maior parte das vezes – de não debater o problema ambiental. O argumento de resistência do pleito uruguaio, quanto a esse tema, foi no sentido de que, tratem-se de pneus novos, usados e remoldeados, ao final de sua vida útil transformam-se em carcaças inservíveis e causam iguais perigos à saúde das pessoas e ao meio ambiente. Não se trata, nessa arbitragem, argumentam os pedidos do Uruguai, de discutir a importação de pneus usados, e sim de pneus remoldeados, que serão destinados ao uso e não imediatamente transformados em resíduos ambientalmente problemáticos. A pretensão do Uruguai restringe-se a obrigar a Argentina a seguir importando pneus remoldeados produzidos no Uruguai, posto que estes têm igual durabilidade e segurança em relação aos pneus novos, sempre tiveram livre ingresso no território argentino e não significam impacto ambiental distinto do que é causado pelo pneu novo. 
  1. O estoppel
  1. O Uruguai pretende ver aplicado ao caso o princípio do estoppel. Afirma que a Lei nº 25.626 suspendeu comportamento comercial constante da Argentina, relativo à admissão da importação de pneus remoldeados do Uruguai, causando a este prejuízos de natureza econômica. Tal comportamento, nas circunstâncias em que se deu, enseja a aplicação do princípio. O estoppel tem sido aplicado como forma de dar estabilidade, certeza e continuidade às obrigações internacionais, sejam elas – ou não – convencionais. O princípio, reconhecido pela jurisprudência internacional em várias oportunidades, não goza de unanimidade quanto ao alcance de seu conceito, pela doutrina. A própria expressão estoppelinclui e admite outras denominações equivalentes relativamente a seus efeitos, muito embora nem sempre quanto a sua natureza. Assim não será difícil encontrar para o mesmo princípio (ou muito semelhante a ele) denominações como “doutrina dos atos próprios”, “venire contra factum proprium non valet or non licet”, “preclusão”, “doutrina da aparência”, “adversus factus suum quis venire non potest”, dentre outras.
  2. Para Ian Browlie[1], o estoppel é um princípio geral do direito internacional, fundado na boa-fé e na consistência das relações internacionais. Schachter entende a aplicação do princípio quando uma parte que se compromete de boa-fé a adotar um certo comportamento ou a reconhecer uma determinada situação jurídica, torna-se impedida pelo estoppel de agir em contradição com esse compromisso ou com esses atos, se as outras partes tenham razoavelmente fundado seu próprio comportamento nesse compromisso.[2] Nessa linha, vale ainda lembrar o conceito de estoppel mais recentemente proposto por Francisco Jiménez García, ao entender que “el estoppel supone la reprobación de la contradicción. No de cualquier contradicción, sino de aquella que pone en entredicho la coherencia y la consistência de los Estados em la realización de sus comportamientos y conductas en el marco de una determinada situación ou relación jurídica internacional. Mediante ese principio se impiede que un Estado reclame para sí la observancia de un derecho de que es titular o el ejercio de una facultad admitida por el Derecho, si tal pretensión resulta contraria con la conducta anteriormente observada por el mismo respecto al contenido de ese derecho o al ejercicio de las facultades que lo integran o que el Derecho reconoce e incompatible con las legitimas expectativas originadas en el patrimonio juridico del Estado o Estados que, de buena fe y de forma razonable, han confiado en la veracidad de la conducta primaria y han acomodado sus intereses de conformidad con el nuevo estado de cosas así creado”.[3]
  3. Mesmo tendo um tratamento cuidadoso pela doutrina, o estoppel tem sido aplicado de formas diversas pela jurisprudência. Não é necessário um esforço maior de pesquisa, para que se encontre no repertório internacional as mais variadas interpretações e aplicações do princípio. Desde logo, lembre-se o Laudo Arbitral, promulgado em 09 de janeiro de 2002, sobre a “Prohibición de Importación de Neumáticos Remoldeados (Remolded) procedentes de Uruguay”, ao  proclamar que “en el marco de las opinones doctrinarias citadas por la Reclamante, el Tribunal entiende que la señalada concurrencia de elementos contestes – tráfico comercial, declaraciones oficiales, a más de los concordantes actos concluyentes de órganos del Estado justifican la invocación del principio del estoppel que realiza la Parte Reclamante”. De outro lado, no caso Comunidades Européias (CEE) – Bananas I, o Grupo Especial (GATT 1947) concluiu que o estoppel somente pode resultar do expresso, ou em casos excepcionais implícito, consentimento das partes reclamantes.[4] E, ainda, nos casos Comunidade Européia (CE) – Asbestos Guatemala – Cimento II, os Grupos Especiais declararam que o estoppel é relevante quando a parte confia razoavelmente (“reasonably relies”) nas garantias da outra parte e, assim, sofre conseqüências negativas resultantes da mudança de posição dessa  outra parte.[5]
  4. O estoppel, para sua caracterização deve conter, no mínimo, três elementos essenciais: (a) uma situação criada por um Estado, entendida como conduta primária; (b) uma conduta seguida por outro Estado, entendida como conduta secundáriae (3) a impossibilidade por parte do Estado que adotou a atitude primária de comportar-se ou manifestar-se em sentido contrário a ela. Trata-se de princípio diretamente vinculado à boa-fé, posto que quem afirma ou admite algo e, ainda mais, quando por uma série de atos, fatos ou omissões consagra a afirmação ou admissão, não pode contradizer esse comportamento. Em matéria de decisões relacionadas ao comércio, além dos casos referidos no item 86, supra, deve ser mencionado o Panel Report do caso Argentina – Direitos Anti-Dumping relativos a Frangos do Brasil (WT/DS241/R), decidido em maio de 2003, onde menciona-se o princípio do estoppel e admite-se sua aplicação naquelas circunstâncias em que (i) uma declaração de fato clara e não ambígua, que (ii) seja voluntária, incondicional e autorizada é (iii) admitida de boa fé.
  5. O estoppel, prática consagrada na jurisprudência como decorrente da boa fé e dos pacta sunt servandaencontra abrigo indireto na Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, quando no artigo 45, letra b), considera ter o Estado admitido a validade do tratado, simplesmente em razão de sua conduta prévia. Vale dizer que atos ou omissões do Estado em consonância com determinado Tratado são suficientes para obrigar tal Estado para os termos do mesmo.
  6. No caso em julgamento, cabe ao Tribunal verificar se houve, por parte da Argentina, ato próprio gerador de obrigações perante o Uruguai, bem como analisar se o comércio de pneumáticos remoldeados existente entre as Partes teria sido suficiente para caracterizar a caracterização de uma prática de natureza comercial constante e regular, apta a gerar no outro Estado uma justa expectativa da existência de uma obrigação de natureza internacional. Do lado do segundo Estado, neste caso, o Uruguai, deve o Tribunal igualmente verificar se, havendo tal prática comercial constante e regular, foi ela suficiente para, a partir de uma justa expectativa, determinar a adoção de postura especifica, em conseqüência dos atos da praticados pela outra Parte, bem como, se a mudança de comportamento comercial da Argentina teria ensejado prejuízos ao Uruguai. Finalmente, e não menos importante, mesmo admitindo-se a existência de requisitos suficientes para configurar a aplicação do princípio do estoppel, cabe indagar se tal princípio é absoluto e não sofre qualquer restrição. Vale dizer que cabe perquirir se a obrigação gerada em decorrência da conduta de um determinado Estado e, que por força do estoppel, deve ser mantida, tem caráter absoluto. Ou seja, se o Estado praticante da conduta primária não tem o direito de suspender tal conduta, se e quando outros princípios, ou motivos fundamentais antes desconhecidos, ditem a necessidade ou conveniência de alterar ou estancar a conduta original.
  1. CONCLUSÕES
  1. Ante o exposto e analisado, o Tribunal Arbitral, por unanimidade (ou pela maioria de votos dos árbitros) decide o quanto articuladamente a seguir se declara.
  2. Quanto ao objeto da controvérsia, reportando-se ao que foi relatado nos itens 42 e seguintes, retro, o Tribunal decide que, primeiramente, se trata da Lei nº 25.626, promulgada pela Argentina, em data de 08 de agosto de 2002, que proibiu a importação de pneumáticos remoldeados para seu território. Entretanto, o que aqui se discutiu não foram os aspectos formais de tal mandamento normativo e sim seu conteúdo, bem como o impacto desse conteúdo sobre o comércio bilateral das Partes. Seria pouco lógico – ou mesmo ingênuo – admitir-se que este Tribunal pudesse, por hipótese, considerar inaplicável a referida Lei, admitindo, porém, que a Argentina editasse outro ato normativo com igual teor e conteúdo. A boa fé, para não dizer o bom senso, indicam que a discussão entre as Partes, tanto neste Tribunal, como antes dele, sempre versou sobre a proibição da importação de pneus remoldeados pela Argentina, proibição essa instrumentada no referido texto legal.
  3. Em face do exposto, este Tribunal define o objeto do litígio como sendo a proibição imposta pela Argentina à importação de pneumáticos recauchutados (remoldeados) para todo o seu território nacional. Referida proibição foi positivada pela Lei nº 25.626 de 2002. Entretanto, além de tal norma, inclui-se no objeto da controvérsia qualquer outro texto legislativo ou administrativo que tenha ou venha a ter, na prática, os mesmos efeitos da citada Lei.
  4. Estabelecido com clareza o objeto da controvérsia, cabe agora, tendo em conta os fatos narrados e comprovados pelas Partes e as normas legais aplicáveis, julgar se houve por parte da Argentina prática reprovável e violadora dos princípios que regem as relações entre os Estados que compõem o Mercosul.
  5. O Tribunal ratifica o entendimento das Partes no sentido de que o artigo 1º do Tratado de Assunção, bem como todo o corpo legislativo que se criou no Mercosul, consagra como base para o estabelecimento desse mercado regional a adoção e o respeito ao princípio da livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre os países, suprimindo-se direitos alfandegários, restrições não-tarifárias e quaisquer outras medidas de efeitos equivalentes. De seu lado, o artigo 1º do Anexo I ao Tratado de Assunção define restrições a livre circulação de bens, como sendo “qualquer medida de caráter administrativo, financeiro, cambial ou de qualquer natureza, mediante a qual um Estado-Parte impeça ou dificulte, por decisão unilateral, o comércio recíproco.
  6. Nesse quadro, o Tribunal entende que a Lei nº 25.626, ao proibir a importação de pneumáticos remoldeados, interrompeu o comércio internacional de tais produtos, e particularmente as exportações do Uruguai para a Argentina, que se desenvolviam, quanto a tais pneumáticos, desde o ano de 1997.
  7. Entretanto, a liberdade de comércio e sua preservação como forma de estruturar o Mercosul não pode ser considerada princípio absoluto e inderrogável, um verdadeiro deus ex machinasurgido para solucionar todos os problemas das relações comerciais e imune a quaisquer exceções.
  8. As Partes não discordaram do fato de que, ao final de sua vida útil, os pneumáticos transformam-se em problema ambiental. Os resíduos decorrentes desses pneumáticos usados são de difícil disposição, tardam séculos para se degradar, são compostos por inúmeros elementos químicos e podem provocar sérios danos ao meio ambiente, ao homem, aos animais, à natureza em geral, se abandonados ao ar livre. Igualmente, podem prejudicar o lençol freático, atingindo o subsolo, quando dispostos em aterros sanitários. Ficou igualmente isenta de dúvida a afirmação de que um pneu somente pode ser remoldeado uma única vez, e que nessa condição apresenta níveis de segurança comparáveis a um pneu novo. No prazo de vida de um pneu remoldeado reside o ponto fundamental desta questão.
  9. Ainda que os laudos de institutos técnicos de elevada reputação em seus respectivos paises (INTI e IPT) divirjam quanto a durabilidade de um pneumático remoldeado, deve-se ficar no espectro ditado por essas análises. Vale dizer, um pneu remoldeado dura, no mínimo, 30% da vida de um pneu novo e, no máximo, tem vida igual a este. Muito embora as Partes não tenham logrado fazer prova convincente da durabilidade de um pneu remoldeado, a admissão de que sua vida útil possa oscilar entre os 30% do INTI e os 100% do IPT, em relação a vida de um pneu novo, é suficiente para fundamentar a decisão deste Tribunal, como adiante se verá.
  10. A reconstrução de pneus é medida salutar e deve ser incentivada, pois reduz (ou melhor retarda) o acúmulo de pneus usados. O que se discute e contesta, entretanto, é a conveniência da importação de pneus remoldeados de outro país. As provas trazidas pelas partes indicam, para efeitos exemplificativos, que um pneu novo deve rodar aproximadamente 60.000 quilômetros. Com a possibilidade de sua remoldagem, e na expectativa otimista, ter-se-á uma rodagem adicional de 60.000 quilômetros. Findo esse período, o pneu transforma-se em resíduo ambientalmente problemático.
  11. Em simples operação aritmética e, partindo-se da expectativa otimista de que um pneu remoldeado possa rodar os mesmos 60.000 quilômetros que um novo, conclui-se que, ao final de 120.000 quilômetros, um veículo de quatro rodas que tenha usado pneus novos e em seguida remoldeados, terá consumido quatro pneus; de outro lado, um idêntico veículo que tenha recorrido ao uso de remoldeados, no mesmo período, terá utilizado oito pneus. Por óbvio, se a vida útil total de um pneu remoldeado for menor do que a de um novo (pois este pode ser remoldeado uma vez e aquele não), com o ingresso no mercado nacional de pneus remoldeados, o passivo ambiental será incrementado no tempo.
  12. Neste quadro, a importação de pneumáticos remoldeados implica para o país importador a aceleração de seu passivo ambiental. A proteção do meio ambiente é princípio básico para o Mercosul. Como já se explicitou anteriormente, o Preâmbulo do Tratado de Assunção e a aplicação do artigo 2º, letra b) do Anexo I ao Tratado, que incorpora o artigo 50 do Tratado de Montevidéu de 1980, são provas inequívocas de que o Mercosul nasceu e deve desenvolver-se protegendo a vida e saúde das pessoas, dos animais e dos vegetais. Não haveria razão para o exercício do livre comércio e conseqüente desenvolvimento econômico e social dos povos dos países do Mercosul, se estes povos fossem condenados a viver em condições ambientais comprometidas pela ação agressiva do homem. No mesmo sentido, foram lembrados nesta sentença o artigo XX do GATT que admite restrições ao comércio internacional por motivos não-econômicos, quando tais restrições são impostas para a proteção da saúde e vida das pessoas e dos animais e para preservar os vegetais. O Acordo Marco sobre o Meio Ambiente do Mercosul, aprovado em 2001, estabelece dentre suas finalidades, dentre outras, a proteção ao meio ambiente. No mesmo sentido a importante Declaração do Rio de Janeiro sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, assinada em 1992, determina que o tema do meio ambiente não pode ser considerado de forma isolada, sendo necessária sua aplicação dentro do quadro maior das relações internacionais.
  13. Reconhecida a importância fundamental da proteção ao meio ambiente e adotados os princípios que orientam a aplicação das normas do Direito Ambiental,  mais especialmente os princípios da cooperação entre os povos, da prevenção e da precaução, como anteriormente analisado (itens 68 e seguintes), o Tribunal entende que a defesa do meio ambiente, desde que fundada em justas razões, pode ser usada como exceção às normas gerais da integração regional, e particularmente aquelas que regulam o livre comércio entre os países do Mercosul.
  14. As reiteradas alegações do Uruguai de que exporta para a Argentina pneus remoldeados para serem usados e consumidos e não pneus usados para serem lançados ao lixo, ainda que – em primeiro momento – possa causar certo impacto, não resiste a uma análise mais profunda. De fato, o que produz e exporta o Uruguai são pneus reconstruídos a partir de carcaças geralmente importadas de países desenvolvidos. O pneu remoldeado não é em si próprio um produto que possa causar dano imediato ao meio ambiente. Entretanto, esse mesmo produto reconstruído, com estrutura advinda de outras regiões do mundo, terá vida útil notavelmente menor do que a de um pneu novo. Vale dizer que será transformado lixo mais rapidamente e fará com que o Estado receptor acumule precocemente resíduos danosos ao meio ambiente para os quais a ciência e a tecnologia ainda não encontraram solução satisfatória.
  15. No caso presente, sendo inquestionável o dano causado pelos resíduos dos pneus ao meio ambiente e sendo, igualmente, imune a dúvidas, que o ingresso em determinado país de pneus remoldeados incrementa seu passivo ambiental, quando compara-se tal incremento com o que seria causado por pneus novos, a Argentina teve justa razão para editar a Lei nº  25.626, de 2002 e, por meio dela, impedir o ingresso no país de pneus usados, recapados ou remoldeados.
  16. Não vê o Tribunal, no caso presente, possibilidade de aplicação do princípio do estoppel. Na seqüência do que foi analisado anteriormente (itens 82 e seguintes, retro), a prevalência do estoppel no caso presente dependeria da existência de um fluxo ou prática comercial suficientes para gerar a expectativa de que se constituía uma obrigação internacional. Tal como antes discutido, também quanto a aplicação do estoppel pode perquirir-se se tal princípio deve prevalecer de forma absoluta, inclusive sobre outros de igual ou maior transcendência. Para verificar-se o ponto primeiro, recorre-se ao Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias e o Relativo à Aplicação do Artigo VI do GATT 1994, quando no primeiro acordo, em seu artigo 6, ao referir-se a “prejuízo grave” determina que para que este se configure deve ser analisada a corrente comercial “durante um período apropriadamente representativo, suficiente para demonstrar tendências claras na evolução do mercado”. Já o artigo 2.2.1 do segundo acordo referido determina que para um comércio ser considerado como base para determinar o valor normal de um produto, essa avaliação deve ter tomado como base “um período prolongado e em quantidades substanciais”.
  17. Compilando-se os dados trazidos pelas Partes ao processo, verifica-se que, segundo informado pelo Uruguai (Anexo 18), foram exportados, em pneumáticos remoldeados, durante o ano de 1998, o  valor de US$ 168,740; durante o ano de 1999, US$ 215,480; durante o ano de 2000, US$ 632,524;, durante o ano de 2001, o valor de US$ 225,241 e durante o ano de 2002, o valor de US$ 235,842.  Não está claro no quadro apresentado pelo Uruguai qual o destino dessas exportações. Tais operações, segundo o Uruguai, ocorreram durante 8 meses no ano 1998; durante 9 meses no ano de 1999; durante 11 meses no ano de 2000; durante 3 meses no ano de 2001 e durante 4 meses dos primeiros oito meses de 2002, quando foi promulgada a Lei nº 25.626.  Igualmente, ao mencionar tais períodos, não se especifica o destino das exportações.
  18. De seu lado, a Argentina informa em quadro estatístico (Contestação apresentada, Quadros de comércio entre as partes e outros) que as importações de pneus remoldeados do Uruguai foram as seguintes: no valor de US$ 28,306 para o ano de 1977; no valor de US$ 4,317 no ano de 1998; no valor de US$ 20,450 no ano de 1999; no valor de US$ 400,431 no ano de 2000 e no valor de US$ 103,985 no ano de 2001, não sendo declarada qualquer movimentação para o ano de 2002. Mencionam ainda os quadros apresentados pela Argentina que as operações com pneus remoldeados com o Uruguai ocorreram durante dois meses no ano de 1997, um mês no ano de 1998, dois meses no ano de 1999, dez meses no ano de 2000 e três meses no ano de 2001.
  19. Ainda que usando critérios distintos, as informações apresentadas pelas Partes permitem ao Tribunal esboçar um quadro realista do efetivo fluxo comercial – entre as Partes – representado pelos pneus remoldeados no período compreendido entre 1997 e 2001. Constata-se que o comércio de tal produto não foi permanente e estável e, com a ressalva do ano de 2001, não teve maior impacto econômico. Ademais, verifica-se das estatísticas apresentadas pelo Uruguai que, mesmo após a vigência da lei argentina e conseqüente proibição de exportar pneus remoldeados para a Argentina, houve grande incremento de exportações uruguaias de tais produtos para outros destinos. Destarte, de uma forma geral e compreensiva, não se pode afirmar que a indústria uruguaia de pneus reconstruídos, como um todo, tenha sofrido impacto negativo após a proibição de importações pela Argentina. Não se cumpre, portanto, o primeiro requisito para a aplicação do princípio do estoppel, posto não ter se comprovado nestes autos um fluxo mercantil permanente, nem tampouco quantidades substanciais nas exportações. Por fim, os números apresentados indicam um crescimento no mercado uruguaio de produção de pneus remoldeados, em decorrência do incremento de exportações desse produto não se comprovando prejuízos no setor produtivo relevante.
  20. Quanto a relativização do estoppel face a outros princípios jurídicos de tal sorte a justificar, como no caso presente, uma restrição de caráter não-econômico ao livre comércio da região, devem ser lembrados os argumentos anteriormente expendidos (vide, por todos, o item 99) que fundamentam o indiscutível compromisso do Mercosul com a preservação do meio ambiente e, muito especialmente, com a proteção da vida e da saúde das pessoas, dos animais e dos vegetais. Ainda que correndo o risco de pecar por excesso, o Tribunal deve lembrar que mesmo com a constatação de “incerteza científica”, que pode ser aferida de várias manifestações das Partes neste processo, além das afirmações concretas sobre segurança, durabilidade e forma de disposição de pneus, é de ser aplicado ao caso os preceitos decorrentes dos princípios da precaução e da prevenção, que permitem a utilização de medidas restritivas de caráter não-econômico ao comércio internacional e relativamente a determinado produto, mesmo cortando um anterior fluxo comercial permanente e substancial. Concluindo, o Tribunal entende não ser aplicável o princípio do estoppel no caso presente, não só porque os antecedentes comerciais não são significativos, seja por seu valor econômico absoluto, seja pela falta de permanência periódica desse comércio, como também pela admissão de que há (e deve haver) princípios superiores que, quando devidamente comprovados, permitem ao Estado impor restrições não-econômicas em seu comércio internacional.
  21. Em suporte da legalidade de sua reclamação, o Uruguai traz a jurisprudência criada no Mercosul pela decisão do Tribunal Arbitral que decidiu,  em 09 de janeiro de 2002, o caso denominado “Prohibición de Importación de Neumáticos Remoldeados (Remolded) Procedentes de Uruguay”.  De fato, tal caso guarda – em sua essência – grande semelhança com este ora posto em julgamento. Também naquela oportunidade, alegando a manutenção das regras que garantem o livre comércio no espaço do Mercosul, o Uruguai pretendia ver anulados os efeitos de norma brasileira que proibia a importação por aquele país de pneus remoldeados. Tal como na presente controvérsia, Uruguai alegava, dentre outros, os argumentos da prioridade das normas do Mercosul para garantir o livre comércio, de comportamento prévio do Brasil que admitia a importação de tais produtos, para posteriormente proibi-la, e ainda a aplicação do princípio do estoppel.
  22. Naquela oportunidade, o Tribunal Arbitral, por unanimidade, deu ganho de causa ao Uruguai, determinando que o Brasil reformulasse sua legislação interna de forma a readmitir a importação de pneus remoldeados. Cessam neste ponto as semelhanças entre aquela decisão e o que se discute nesta arbitragem. Uma leitura cuidadosa do laudo arbitral prolatado janeiro de 2002 indicará que o Tribunal, naquela oportunidade, preocupou-se exclusivamente em verificar se o comportamento do Brasil implicava (ou não) violação ao princípio do livre comércio. Preocupou-se igualmente o Tribunal em analisar se o fluxo comercial do produto existia e era substancial. Preocupou-se o Tribunal em comprovar se havia por parte do Brasil uma prática comercial injustificadamente interrompida, atingindo o princípio do livre comércio que deve estar protegido de restrições não-econômicas. Com base nestas preocupações, o Tribunal ditou sua decisão.
  23. Não há, entretanto, em todo o laudo arbitral qualquer preocupação com a preservação do meio ambiente. Não cuidou o Tribunal de analisar as exceções ao princípio da livre concorrência fundadas na proteção da vida e da saúde das pessoas, dos animais e dos vegetais. Não se preocupou o Tribunal em analisar os princípios de direito internacional, nem tampouco os específicos do Mercosul, que autorizariam a relativizar as normas comerciais e econômicas em nome de um ambiente mais sadio para a região. Em nenhum tópico daquela decisão arbitral menciona-se, por exemplo, artigo 2º do Anexo I ao Tratado de Assunção ou mesmo o artigo 50 do Tratado de Montevidéu de 1980, marcos jurídicos de importância fundamental no deslinde desta atual arbitragem.
  24. Aqui, além das inerentes discussões sobre a liberdade de comércio e os princípios e normas que asseguram o livre comércio no Mercosul, as Partes e, mais particularmente, a Argentina, trouxeram dados, fatos e argumentos diretamente relacionados com o Direito Ambiental. Discutiu-se à exaustão a durabilidade dos pneus remoldeados e – em conseqüência – o tempo findo o qual serão transformados em resíduos perigosos, tal como todos os pneus inservíveis. O tema da preservação ambiental foi contraposto ao do livre comércio. Assim, ao contrário do caso referido, este Tribunal não pode ignorar a importância e impacto dos argumentos de natureza ambiental. Não só não ignorou a relevância de tais aspectos jurídicos, como os considerou suficientes para temperar e relativizar o princípio da livre circulação de bens e serviços, admitindo-se como exceção justificada a sua plena aplicação. Destarte, referido fundamento jurisprudencial, tal como proposto, não é aplicável a este caso.
  25. Restam ainda breves e derradeiras consideraçôes sobre dois aspectos levantados pelo Uruguai neste procedimento. Menciona que teria havido discriminação por parte da Argentina, pois, já na vigência da Lei nº 25.626, teriam ocorrido importações de pneus remoldeados de outras origens. Argentina refutou a alegação, admitindo a ocorrência de importações temporárias de tais produtos em quantidade insignificante e exclusivamente para experimentos e testes. Juntou documentos nesse sentido e a versão apresentada não foi contestada. Quanto a existência de inúmeras fábricas argentinas dedicadas à reconstrução de pneus, o argumento não afeta a decisão deste Tribunal ao reconhecer que pneus remoldeados no próprio país reduzem a aceleração do passivo ambiental, enquanto que a importação de tais produtos, mormente em face de sua vida útil mais reduzida, incrementam tal passivo. 
  1. DECISÃO

Por todo o exposto e pelo demais que deste processo consta, de conformidade com o Protocolo de Olivos, com as normas e princípios jurídicos aplicáveis à matéria e, nos termos das Regras de Procedimento aprovadas em data de 19 de agosto de 2005, este Tribunal Arbitral Ad Hoc constituído para conhecer e julgar a controvérsia envolvendo a República Oriental del Uruguay e a República Argentina sobre “Prohibición de Importación de Neumáticos Remoldeados”  D E C I D E: 

  1. Por unanimidade (ou pela maioria de votos dos Senhores Árbitros) que a Lei nº 25.626, promulgada pela República Argentina em 08 de agosto de 2002 e publicada no Boletín Oficial, em 09 de agosto de 2002, é compatível com o disposto no Tratado de Assunção e seu Anexo I, com as normas derivadas de tal Tratado, bem como com as disposições de Direito Internacional aplicáveis à matéria.
  2. Por unanimidade (ou pela maioria de votos dos Senhores Árbitros) determinar,  nos termos do artigo 36.1 do Protocolo de Olivos, que os custos e despesas deste procedimento arbitral sejam pagos ou reembolsados à Secretaria Administrativa do Mercosul, conforme o caso, da seguinte forma: (a) cada Parte arcará com os custos e despesas do árbitro por ela indicado, bem como com os custos e despesas de representantes, assessores e peritos por ela respectivamente nomeados ou indicados; (b) os custos e despesas incorridos com e pelo Presidente do Tribunal serão arcados em partes iguais pelas Partes; (c) as Partes partilharão igualmente entre si todos os custos e despesas, inclusive de natureza administrativa, incorridos pela Secretaria Administrativa do Mercosul com a organização e condução deste processo. Os pagamentos e reembolsos de custas e despesas, na forma aqui definida, deverão ser efetuados pelas Partes correspondentes diretamente à Secretaria Administrativa do Mercosul, dentro do prazo improrrogável de 30 (trinta) dias contados da notificação do Laudo.
  3. Por unanimidade autorizar a Secretaria Administrativa do Mercosul a efetuar, de imediato, todos os pagamento ainda pendentes e relativos ao presente processo, nos termos da decisão prolatada, com recursos disponíveis no Fundo Especial, debitando-os às Partes nas proporções aqui determinadas.
  4. Por unanimidade determinar que os autos e todos os documentos relativos ao presente processo permaneçam arquivados na Secretaria Administrativa do Mercosul.
  5. Por unanimidade declarar que, ressalvado o disposto nos artigos 28.1 e 17 do Protocolo de Olivos, o disposto neste Laudo é obrigatório para as Partes e tem efeito imediato, de conformidade com o que determinam os artigos 26 e 27 do mesmo Protocolo.

Sejam as Partes notificadas desta decisão por intermédio da Secretaria Administrativa do Mercosul, desde logo por correspondência eletrônica e, na seqüência com o documento oficial. O presente Laudo Arbitral vai redigido em Português, devendo a Secretaria Administrativa do Mercosul, para maior comodidade e facilidade das Partes, providenciar, no menor prazo possível, sua tradução para o idioma Espanhol. A versão em Português do Laudo Arbitral será a única oficial e prevalecerá sobre a tradução em Espanhol, que  por seu caráter não-oficial não será revista ou autenticada pelos Árbitros.

Publique-se. 

José María Gamio

Árbitro 

Marcelo Antonio Gottifredi

Árbitro 

Hermes Marcelo Huck

Árbitro Presidente

[1] Ian Browlie, Principles of International Public Law, 5th ed., Oxford University Press, 1998, p. 646.

[2] Oscar Schachter, Droit International, Bilan et Perspectives, org. Mohammed Bedjaoui, Tomo 1, Paris, 1991.

[3] Francisco Jiménez García, Los comportamientos recíprocos en Derecho Internacional: A proposito de la aquiescencia, el estoppel y la confianza legítima, Editorial Dilex, Madrid, 2002, p. 236.

[4] Relatório do Grupo Especial: EEC – Member States’ Import Regimes for Bananas (EEC – Bananas I),junho de 1993 – DS32/R.

[5] Relatório do Grupo Especial – European Communities – Measures affecting asbestos and asbestos-containing products (EC-Asbestos), WT/DS 135R, modificado pelo Relatório do Órgão de Apelação, WT/DS135/AB/R, para 8.60 e Relatório do Grupo Especial – Guatemala – Definitive anti dumping measures on Gray Portland Cement from México, WT/DS156R, pars. 8.23 e 8.24.

En español:

MERCOSUR – Tribunal Arbitral

CONTROVERSIA ENTRE LA REPÚBLICA ORIENTAL DEL URUGUAY Y LA REPÚBLICA ARGENTINA “PROHIBICIÓN DE IMPORTACIÓN DE NEUMÁTICOS REMOLDEADOS

LAUDO ARBITRAL

Dr. Hermes Marcelo Huck Presidente, Dr. José María Gamio Miembro, Dr. Marcelo Antonio Gottifredi Miembro

(25 de octubre de 2005)

Laudo Arbitral

En la ciudad de Montevideo, República Oriental del Uruguay, a los 25 días del mes de octubre de 2005.

Laudo dictado por el Tribunal Arbitral constituido para solucionar la controversia surgida entre la República Oriental del Uruguay (en adelante denominada “Parte Reclamante”, “Reclamante” o “Uruguay”) y la República Argentina (en adelante denominada “Parte Reclamada”, “Reclamada” o “Argentina”), que versa sobre la “Prohibición de Importación de Neumáticos Remoldeados”.

I.-   Antecedentes

A.-  EL TRIBUNAL ARBITRAL

  1. El Tribunal Arbitral, debidamente constituido para juzgar la presente controversia, de conformidad con lo dispuesto en el Protocolo de Olivos, del 18 de febrero de 2002, constituido por los árbitros, Dr. Hermes Marcelo Huck de la República Federativa del Brasil (Presidente del Tribunal), Dr. José María Gamio de la República Oriental del Uruguay y Marcelo Antonio Gottifredi de la República Argentina.
  2. El Presidente notificado de su designación y el Tribunal constituido el 26 de julio de 2005, fue debidamente instalado el 19 de agosto de 2005, en la sede de la Secretaría Administrativa del Mercosur, en la ciudad de Montevideo, República Oriental del Uruguay. En sesión del día 19 de agosto de 2005, el Tribunal realizó su primera reunión, en la cual fueron adoptadas sus Reglas de Las Partes fueron

invitadas a designar sus respectivos representantes y constituir domicilio en la ciudad de Montevideo, donde funcionó el Tribunal, a presentar por escrito sus argumentos, así como a informar si aceptaban o se oponían a la intervención de terceros Estados Partes del Mercosur en el procedimiento arbitral.

  1. La Parte Reclamante, dentro del plazo que le fue concedido, presentó sus argumentos por escrito, habiendo sido comunicados los mismos por el Tribunal a la Parte Reclamada; ésta, igualmente en el plazo que le fue concedido, presentó su contestación por escrito. La contestación de Argentina fue comunicada al Uruguay. Igualmente, en cumplimiento de lo determinado por el Tribunal, las representaciones y los domicilios fueron designados para las notificaciones que corresponden. El Uruguay nombró como sus representantes a los Doctores Hugo Cayrús Maurin, José María Robaina, Myriam Fraschini y al Ingeniero José Luis Heijo, habiendo la Argentina indicado como sus representantes al Lic. Adrián Makuc (Titular) y al Ministro Daniel Raimondi (Alterno). Las pruebas documentales presentadas por las Partes fueron aceptadas y comunicadas a la otra Parte y posteriormente incorporadas al Proceso que se tramitó en la Secretaría.
  2. Por manifestación escrita, del 30 de agosto de 2005, la Argentina informó no tener objeciones a la participación en el proceso arbitral de terceros Estados Miembros del Mercosur. Por manifestación escrita, del 1 de septiembre de 2005, el Uruguay informó al Tribunal que se oponía a la participación de terceros Estados en el proceso arbitral. Quedo, así, excluida la participación de terceros Estados en el presente arbitraje.
  3. Por medio de la Orden Procesal Nº 4, de 21 de septiembre de 2005, el Tribunal Arbitral, en los términos de lo dispuesto en el artículo 16 del Protocolo de Olivos, prorrogó el plazo para el pronunciamiento del laudo arbitral por 30 (treinta) días más, contados a partir de 26 de septiembre de 2005.
  4. El Tribunal Arbitral convocó a las Partes para la Audiencia a celebrarse en la sede de la Secretaría Administrativa del Mercosur, el día 11 de octubre de 2005, a las 09:30 horas, estableciendo que se indicasen previamente las pruebas que pretendían producir en el curso de tal Audiencia. El representante de Argentina solicitó un aplazamiento de la Audiencia, siendo tal solicitud rechazada por fuerza de la Orden Procesal Nº 6, por las razones allí expuestas, y mantenida la realización de la Audiencia para la fecha previamente informada a las Partes.
  5. En nota del 6 de octubre de 2005, Uruguay informó que haría prueba pericial durante la Audiencia, por medio de la exposición del Ingeniero Ricardo Leone. En la nota del 6 de octubre de 2005, Argentina informó que presentaría en la Audiencia a los peritos Dr. Jorge Mandelbaum, Lic. Liliana Rehak, Dra. Leila Devia y la Dra. Raquel Turcán. Anexó a su pedido los curricula de los peritos, así como una lista de preguntas que pretendía efectuarles. Argentina posteriormente solicitó que fuesen exhibidos dos videos durante la Audiencia.
  6. El día 11 de octubre de 2005, a las 09:30 horas, se realizó la Audiencia designada. Fueron escuchadas las declaraciones de los peritos indicados por ambas partes, habiéndose manifestado primeramente el perito designado por Uruguay y posteriormente los peritos nombrados por Argentina. El perito indicado por Uruguay presentó una serie de consideraciones y de datos sobre la producción y funcionamiento de los neumáticos remoldeados, haciendo acompañar su exposición por una exhibición de slides por el sistema power point. Posteriormente, respondió a preguntas formuladas por las Partes, así como por los árbitros. Los peritos nombrados por la Argentina declararon en dos momentos distintos. Primeramente, fueron escuchados el Dr. Jorge Mandelbaum y la Lic. Liliana Rehak, que respondieron a las preguntas previamente formuladas por la Argentina, así como las realizadas por los representantes del  Uruguay  y  por  los  árbitros.  Tales  preguntas estuvieron referidas a los aspectos técnicos de fabricación y uso de los neumáticos remoldeados. Seguidamente, fueron escuchados los peritos Dra. Leila Devia y Dra. Raquel Turcán, respondiendo inicialmente a las preguntas previamente formuladas por la Argentina y posteriormente las que les fueran sometidas por los representantes de Uruguay. Tales preguntas versaban sobre aspectos jurídicos de la preservación del medio ambiente, del impacto ambiental causado por la disposición de neumáticos usados, así como sobre medidas técnicas discutidas y adoptadas para la minimización de este problema. El representante de la Argentina, después de la declaración de los peritos, realizó una exhibición de dos videos, siendo uno de ellos relativo a periodismo televisivo producido en México y otro un comercial de televisión. El Tribunal consideró plenamente inteligibles las pruebas presentadas por las Partes en el curso de la Audiencia.
  7. Tal como fue dispuesto en el Acta de la Sesión Nº 2, relativa a la Audiencia ocurrida en el día 11 de octubre de 2005, acta firmada por los árbitros y por los representantes de las Partes, sin ninguna reserva, las declaraciones de los peritos fueron resumidas por la Secretaría del Mercosur y encaminados a las Partes para que presentasen sus observaciones y sugerencias relativas al texto resumido. El 17 de octubre de 2005, las Partes presentaron sus observaciones y sugerencias al texto resumido de las declaraciones prestadas por los peritos que habían declarado durante la Audiencia. Tanto el resumen de las declaraciones, como las observaciones presentadas por las Partes integran el presente proceso y complementan la citada Acta de Sesión Nº 2.
  8. Completadas las pruebas, las Partes presentaron sus alegatos En el plazo definido por el Tribunal, las Partes sometieron los respectivos Alegatos Finales, por escrito.

B.-      TRAMITE PREVIO

  1. El Tribunal Arbitral fue constituido de conformidad con lo dispuesto en el Protocolo de Olivos, habiendo sido cumplidos todos los términos y condiciones en él establecidos para la solución de conflictos. Anteriormente al inicio del procedimiento arbitral fueron realizadas las gestiones previas destinadas a la solución de la controversia surgida entre las Partes, a saber:
  2. En la LVI Reunión Ordinaria del Grupo Mercado Común (GMC), realizada en la ciudad de Rio de Janeiro, Brasil, el 25 y 26 de noviembre de 2004, Uruguay informó sobre la posibilidad de poner en práctica el mecanismo de solución de controversias, en virtud de la prohibición establecida por la Argentina, a través de la Ley Nº 25.626, para la importación de neumáticos remoldeados.
  3. A través de la Nota Nº 2388/2004, Uruguay solicitó el inicio de negociaciones directas entre las Partes, en los términos de los artículos 4º y 5º del Protocolo de Olivos, proponiendo la realización de una reunión entre las Partes en la ciudad de Belo Horizonte, donde se realizaría la XXVIII Reunión Extraordinaria del La Secretaría del Mercosur fue informada de esa propuesta, por medio de la Nota Nº 2391/2004, de 06.12.2004, presentada por el Uruguay.
  4. La Argentina, por su Coordinador General del GMC, respondió con la Nota SCREI Nº 888/2004, de 10.12.2004, acusando recibo de la nota de Uruguay y proponiendo una reunión bilateral, en fecha alternativa, a ser realizada en la ciudad de Buenos Aires.
  5. La referida reunión entre las Partes fue realizada el día 23 de diciembre de 2004, en la ciudad de Buenos Aires. Las Partes expusieron sus argumentos.
  6. Por manifestaciones recíprocas, las Partes discutieron alternativas para poner fin a la controversia, sin haber logrado llegar a un consenso en cuanto a sus diferencias.
  7. Sin haber llegado a una solución para la controversia, Uruguay, por medio de la Nota Nº 130/2005, de 23 de febrero de 2005, comunicó a la Secretaría del Mercosur que pretendía dar inicio al procedimiento arbitral, tal como está previsto en el Capítulo VI y siguientes del Protocolo de Olivos.
  8. Los procedimientos del Tribunal Arbitral fueron registrados por la Secretaría Administrativa del Mercosur y se desarrollaron de conformidad con el Protocolo de Olivos y con las Reglas de Procedimiento aprobadas por el Tribunal. Las Partes presentaron sus manifestaciones escritas y orales dentro de la forma y plazos establecidos.
  9. En consecuencia de lo antes expuesto, en los términos del Capítulo VI del Protocolo de Olivos y demás legislación aplicable, este Tribunal Arbitral tiene plena capacidad para emitir el presente LAUDO ARBITRAL, para el cumplimiento de las Partes y para que se produzcan todos los términos y efectos del derecho.

C.-      ALEGATOS DE LAS PARTES

  1. El pedido de Uruguay
  2. Uruguay contesta la legitimidad de la decisión de Argentina en sentido de prohibir la importación de neumáticos reconstruidos. Afirma que había normas administrativas que prohibían la importación de neumáticos usados para la Argentina (posición 4012.20.00). Una nota divulgada por la Dirección General de Industria (Nº 89/2001), circulada en el SIM (Sistema Informático María) menciona que una anterior prohibición de neumáticos usados previstas en el artículo 38 del Decreto 660/00 también alcanzaba a neumáticos reconstruidos. Posteriormente, la Ley Nº 25.626, de 09.08.2002, extiende para todo el territorio nacional de Argentina la prohibición de importación de neumáticos y cámaras neumáticas recauchutadas (posición 4012.10.00).
  3. Alega Uruguay que, anteriormente a tal Ley, la prohibición de importación se restringía a neumáticos usados, pero era libre la importación de neumáticos remoldeados, que se incluyen en la categoría de recauchutados. Así, entre los años de 1997 a 2001, las industrias uruguayas produjeron neumáticos remoldeados que fueron exportados a Argentina, sin ninguna restricción. Por la sanción de la Ley Nº 25.626, a partir del primer trimestre de 2001, fueron suspendidas las exportaciones de tales neumáticos remoldeados para la Argentina. Sin embargo, con posterioridad a la vigencia de tal Ley, fueron hechas por la Argentina importaciones de neumáticos recauchutados de otros países, en los que no figuraba el Uruguay. Resalta, además, el pedido inicial que la Nomenclatura Común del Mercosur (NCM) tiene posiciones aduaneras distintas para neumáticos recauchutados (4012.11.00), neumáticos para ómnibus y camiones (4012.12.00), neumáticos de aeronaves (4012.13.00), demás neumáticos (4012.19.00) y para neumáticos usados (4012.20.00).
  4. La Ley contestada al extender la prohibición de importación a los neumáticos remoldeados ignoró las efectivas diferencias que existen entre tales neumáticos y los usados. Según la posición uruguaya, los neumáticos remoldeados no generan problemas de seguridad de transito o al medio ambiente distintos de los problemas generados por un neumático nuevo.
  5. Alega que el uso de neumáticos remoldeados ha sido aconsejado inclusive en los países desarrollados y, luego de describir el proceso de remoldeado, presenta conclusiones del IPT (Instituto de Investigaciones Tecnológicas de la Universidad de São Paulo) en el sentido de que el neumático remoldeado “posee, en principio, las mismas características del neumático nuevo”. Refiere a su vez el pedido inicial a determinados exámenes técnicos que asegurarían la calidad de tales neumáticos.
  6. Seguidamente, el pedido inicial de Uruguay comenta el artículo 50 del Tratado de Montevideo, en el cual son enunciadas las hipótesis excepcionales, cuando son autorizadas barreras no-arancelarias a la importación de productos por los Estados subscritores. Analiza cada una de tales hipótesis, argumentando que en el caso de los neumáticos remoldeados no se puede hablar de protección a la seguridad (art. 50, inciso b), puesto que esos productos son seguros, tanto que la Argentina autoriza su utilización por la flota nacional. Además, tales neumáticos son utilizados mundialmente, inclusive para abastecer aeronaves, donde los requisitos de seguridad son más rigurosos. En lo relativo a la hipótesis de protección a la vida y salud de las personas, animales y vegetales (art. 50, inciso d), afirma que la durabilidad de un neumático remoldeado es idéntica a la de un neumático nuevo, no habiendo – por lo tanto – impacto adicional al medio ambiente. Además existen en la Argentina más de 70 plantas industriales que producen neumáticos reconstruidos, siendo los mismos libremente utilizados por los vehículos
  7. Después de mencionar que la Decisión del Consejo del Mercado Común 70/00 – sobre Política Automotriz del Mercosur no abarca neumáticos remoldeados, el pedido de Uruguay lista una larga serie de medidas legislativas y administrativas de varios países del mundo, en los cuales se admite el uso de neumáticos remoldeados.
  8. La demanda de Uruguay, a continuación, afirma que la prohibición impuesta por la Argentina a la importación de neumáticos remoldeados viola los artículos 1º y 5º del Tratado de Asunción, por inhibir injustificadamente a la libre circulación de bienes en el ámbito del Mercosur. La modificación de las condiciones pre-existentes, una interrupción del flujo comercial entre los países no son admisibles en el sistema del Mercosur, donde las medidas sobre comercio de bienes deben fundarse en acuerdos que creen vínculos jurídicos y no en medidas unilaterales adoptadas por sus miembros. En el mismo sentido, argumenta Uruguay, la prohibición de importaciones adoptada por la Argentina violaría el Anexo I del Tratado de Asunción, las Decisiones Nºs 22/00 y 57/00, relativas al Acceso a Mercados, adoptadas por el Consejo del Mercado Común.
  9. La edición de la Ley Argentina igualmente violaría, según Uruguay, varios dispositivos de Derecho Internacional, admitido como derecho aplicable al caso según el Protocolo de Olivos, tales como el pacta sunt servanda, el principio de buena fe, consagrado por el artículo 26 de la Convención de Viena de 1969 sobre Derecho de los Tratados. Adiciona, además a su argumentación, los principios del Derecho de Integración, tales como los adoptados en el laudo arbitral dictado el 9 de enero de 2002 sobre la controversia análoga a la presente que confrontó a la República Oriental del Uruguay y los Estados Unidos del Brasil.
  1. Habiendo sido analizadas las normas y principios del Derecho Internacional, inclusive aquellas adoptadas y practicadas en el marco del GATT y de la OMC, la demanda uruguaya argumenta que, en el caso presente, es aplicable el “principio y norma internacional del estoppel”.
  1. Finalmente, Uruguay solicita, ante todo lo expuesto, que sea declarada por el Tribunal Arbitral la incompatibilidad de la Ley Nº 25.626 de la República Argentina con las normas y principios vigentes en el Mercosur, así como con los principios y disposiciones del Derecho Internacional y que, por lo tanto, la República Argentina derogue la referida Ley, así como anule todas las medidas de efectos similares, absteniéndose de adoptar en el futuro otras medidas que tengan efectos restrictivos y/o discriminatorias semejantes a las cuestionadas en el presente litigio.
  1. Contestación de Argentina
  1. En su respuesta, la Argentina rechaza la amplitud del objeto del arbitraje definido por Uruguay, pues al solicitar que la decisión del Tribunal alcance otras medidas además de la Ley Nº 25.626, estaría incluyendo en el litigio un pedido genérico, inespecífico y con alto grado de abstracción.
  1. La contestación de Argentina retoma los antecedentes de la divergencia, mencionando la propuesta de acuerdo hecho a Uruguay y que no obtuvo de este la debida respuesta. Relata las negociaciones bilaterales directas realizadas entre las Partes, así como detalla la referida propuesta de acuerdo sometida al Uruguay, en el sentido de establecer un límite cuantitativo de neumáticos remoldeados a ser importados por la Argentina de Uruguay, límite ese definido por el número de neumáticos usados que el Uruguay importase de la Argentina. Uruguay no concordó con la propuesta de negociación así formulada.
  1. Según la argumentación de Argentina, la Ley Nº 25.626, caracterizada como una prohibición de carácter no-económico, está amparada en las hipótesis listadas por el artículo 50 del Tratado de Montevideo, receptado por el Anexo I del Tratado de Asunción. La ley argentina no solo resulta acorde con la legislación del Mercosur, sino que significa un paso adelante para alcanzar el bienestar de los pueblos de la región, a través de la protección del medio ambiente y la salud de las personas, animales y vegetales que habitan en su territorio.
  1. Argentina alega que la Ley en discusión es una medida de carácter preventivo destinada a evitar el daño potencial que los neumáticos remoldeados, en cuanto a residuos peligrosos por su difícil y onerosa disposición final, puedan causar al medio ambiente, a la salud de las personas, animales y vegetales, comprometiendo el desarrollo de las generaciones presentes y futuras. La contestación de Argentina confirma el reconocimiento y aceptación de las normas que se destinan a promover el libre comercio en el Mercosur, pero argumenta que el artículo 50 del Tratado de Montevideo de 1980 garantiza el amparo legal a sus pretensiones.
  1. Según la Parte Reclamada, la excepción al libre comercio creada por el artículo 50 del Tratado de Montevideo y, más especialmente su inciso d), que menciona de la protección a la vida y a la salud de las personas, animales y vegetales, fue reconocida por Tribunales Arbitrales Ad Hoc, constituidos en el ámbito del Mercosur, en el marco del Protocolo de Brasilia. La contestación de Argentina, en esa línea, comenta la decisión adoptada en el laudo arbitral que dirimió la controversia entre Argentina y Brasil.
  1. De esta manera, concluye la Argentina, la Ley Nº 25.626 está incluida entre las excepciones previstas en el artículo 50 del Tratado de Montevideo, pues (a) el bien jurídico tutelado es la protección a la vida y la salud de las personas, de los animales y de los vegetales; (b) el comercio de neumáticos remoldeados entre Argentina y Uruguay fue marginal e insignificante en base de total de exportaciones hechas de Uruguay para la Argentina y (c) no se aplica al caso el principio de la proporcionalidad, pues cuando está en juego la vida, la salud, el nivel de vida de los habitantes del país, así como los recursos naturales existentes, sería imposible implementar una medida de proporcionalidad.
  1. A continuación, la Argentina pasa a discutir la existencia de medidas de excepción al libre comercio vigentes en el ámbito multilateral y en la Unión Europea. En esa línea, discute en detalle el artículo XX del GATT 1994, refiriéndose a decisiones adoptadas por la Organización Mundial del Comercio, entendiendo que, tal como fue exigido en tales decisiones, la Argentina puede comprobar la compatibilidad de la Ley restrictiva adoptada con el objetivo de preservar el medio ambiente, respetados los principios de no discriminación, de la necesidad y de la proporcionalidad, puesto que, como argumenta, no sería posible alcanzar tales objetivos con la adopción de otras medidas.
  1. La contestación presentada por Argentina analiza, seguidamente, el artículo

30 del Tratado de Roma, en el cual también son reconocidas excepciones al principio de libre comercio, cuando son dictadas para la preservación de la salud y de la vida de las personas y de los animales, así como para la preservación de los vegetales. Se refiere asimismo a decisiones jurisprudenciales adoptadas con fundamento en el citado artículo Comenta las Decisiones Nºs. 22/00 y 57/00 del Consejo de Mercado Común, reconociendo que la primera consagra el compromiso de los Estados Miembros en no adoptar medidas restrictivas al comercio reciproco. Sin embargo, afirma que tal Decisión ratifica la excepción consagrada en el artículo 2º, letra b) del Anexo I al Tratado de Asunción. Analiza los argumentos presentandos en el pedido inicial de Uruguay, en relación a tales Decisiones, para refutarlos individualmente.

  1. A continuación, la defensa Argentina hace comentarios sobre el Laudo Arbitral emanado de la controversia sobre importación de neumáticos remoldeados que involucró a Uruguay y Brasil, para afirmar que determinadas conclusiones de dicho Laudo son equivocadas y se apartaron substancialmente de la doctrina emanada de todos los Laudos arbitrales que anteriormente se habían pronunciado sobre la materia, en el ámbito del Mercosur. El Laudo Arbitral mencionado no hace ninguna referencia a la excepción prevista en el Tratado de Asunción, que remite al artículo 50 del Tratado de Montevideo de 1980. Argumenta la contestación que dicho Laudo ignoró totalmente el carácter evolutivo de la ciencia, la tecnología, el derecho en general, el derecho ambiental particularmente, la salud etc habiendo concluido que los Estados Partes estarían inhibidos de restringir o prohibir el ingreso a sus territorios de productos que, en determinado momento se comercializaban sin restricciones por desconocimiento de sus propiedades nocivas para la salud humana o perjudiciales al medio ambiente.
  1. Afirma la defensa que las excepciones al libre comercio existen tanto en el marco del Mercosur, como también en la Unión Europea y en la Organización Mundial de Salud, concluyendo que (a) es lícito y posible admitir la aplicación de medidas restrictivas de carácter excepcional; (b) las medidas implementadas deben estar efectivamente destinadas a proteger bienes de naturaleza superior o valores no económicos.
  1. La contestación afirma luego que no existe ninguna discriminación en la medida restrictiva adoptada, pues desde marzo de 2001, ningún neumático reconstruido ingresó en el territorio argentino en forma definitiva; la medida no caracteriza una restricción encubierta al comercio bilateral, porque el volumen comercial de tal producto entre los dos países era insignificante; hubo ofertas de la Argentina para resolver amigablemente la controversia, mediante la exportación temporaria de neumáticos usados argentinos para Uruguay, donde serían remoldeados y así retornarían al territorio argentino; el objetivo de la Ley Nº 25.626 es mantener controlado el “pasivo ambiental” argentino, y no proteger el recauchutador nacional o restringir el comercio, pues si así no fuese, no se habría propuesto el acuerdo en el cual constaba la reconstrucción de neumáticos en
  1. En los puntos siguientes, la defensa presentada por Argentina se refiere largamente al proceso legislativo del que resultó la aprobación de la Ley Nº 626, indicando que en el debate parlamentario quedó claro que la medida se destinaba a prevenir el ingreso de residuos disfrazados de mercaderías con vida útil comprometida o agotada, así como los impactos ambientales, actuales o latentes resultantes de tales mercaderías, teniendo en cuenta la complejidad de su gestión y los elevados costos involucrados. La defensa igualmente refiere al principio de prevención en Derecho Ambiental, asegurando el carácter de protección ambiental de la Ley contestada. Finalmente, recuerda las preocupaciones con el medio ambiente reveladas en los documentos del Mercosur, particularmente en el Preámbulo del Tratado de Asunción. Asimismo, sobre tales preocupaciones, menciona el Acuerdo Marco sobre Medio Ambiente del Mercosur, del 22 de junio de 2001, así como el proyecto de Gestión Ambiental de Residuos y Responsabilidad Post Consumo, todavía en discusión por el Consejo del Mercado Común.
  1. Se refiere la defensa al pasivo ambiental y los daños infringidos a la salud de las personas y animales por los neumáticos al final de su vida útil; los riesgos resultantes de la quema de tales productos; sobre los peligros resultantes de almacenaje a cielo abierto, recordando la Directiva del Parlamento Europeo (2000/53/CE) relativa a disposición de vehículos, sus componentes y materiales, al final de su vida útil. Analiza el hecho de que Uruguay importa carcasas de países desarrollados fuera del territorio del Mercosur, concluyendo que tal hecho implica un impacto negativo mediato como consecuencia del corto periodo de reutilización del neumático remoldeado y de la falta de soluciones concretas para su disposición final y efectos sobre el medio ambiente.
  1. La contestación Argentina refuta como no aplicable al caso el principio de estoppel, analiza las nomenclaturas aduaneras de productos, indica datos estadísticos sobre el volumen de importaciones argentinas de neumáticos recauchutados o usados, indicando la participación del Uruguay en ese comercio. Menciona también datos estadísticos del Uruguay, indicando el volumen de importación de neumáticos usados por aquel país.
  1. La defensa presentada por Argentina procura refutar individualmente los argumentos presentados por Uruguay en su pedido inicial. Concluye su defensa argumentando que la Ley Nº 25.626 es compatible con las normas del Mercosur; que tal Ley fue adoptada en cumplimiento al artículo 41 de la Constitución Nacional de Argentina; que la preservación del medio ambiente y de la salud de las personas, animales y vegetales es necesaria para alcanzar los objetivos del Mercosur; que la mencionada Ley tiene fundamento en el principio preventivo en materia ambiental; que los principios de libre comercio y de la protección al medio ambiente integran igualmente las normas del Mercosur; que los neumáticos remoldeados en Uruguay utilizan carcasas importadas de países desarrollados y teniendo vida útil reducida pueden convertir a la región en un “basurero de residuos importados y potencialmente peligrosos”; que varios países de la región, tales como Chile, Perú y Ecuador, adoptaron normas que prohíben la importación de neumáticos usados y/o recauchutados; que la Argentina mantiene como política la protección del medio ambiente; que el principio de libre comercio es relativizado por el Tratado de Asunción al admitir las excepciones del artículo 50 del Tratado de Montevideo.
  1. Por fuerza de raciocinio presentado, Argentina entiende que la Ley atacada es excepcional, tiene carácter de proporcionalidad, no es discriminatoria, se destina a proteger uno de los valores enumerados en el artículo 50 del Tratado de Montevideo, y no se dispone de alternativa menos restrictiva al comercio intra-
  1. La Argentina requiere al final de su defensa que se declare la norma cuestionada por el Uruguay como compatible con las prescripciones del Tratado de Asunción y de su Anexo I, así como con las normas dictadas como consecuencia del mismo y con las disposiciones de Derecho Internacional aplicables a la
  1. FUNDAMENTOS DE LA DECISIÓN
  1. Teniendo presentes los argumentos traídos por las Partes, bien como las pruebas realizadas durante el curso del arbitraje, el Tribunal Arbitral, ponderando los hechos y el derecho traídos a su conocimiento y análisis, basa su decisión, al final dictada, en los argumentos ya analizados, así como, entre otros, en los fundamentos y consideraciones de hecho y de derecho presentados a continuación.
  1. Objeto de la Controversia
  1. Uruguay define como objeto de la controversia presentada ante el Tribunal a la Ley Nº 25.626 de la República Argentina, promulgada el 8 de agosto de 2002 y publicada en el Boletín Oficial, el día 9 de agosto de 2002, que prohíbe la importación de determinados productos, entre los cuales se encuentran aquellos incluidos en la Nomenclatura Común del Mercosur, individualizados y clasificados en el Sistema Armonizado de Designaciones y Codificación de Mercaderías, bajo el NCM 4012.10.00 neumáticos (cámaras neumáticas) recauchutados (entre los cuales se incluyen los neumáticos remoldeados). Igualmente, Uruguay entiende que se incluye en el objeto de la controversia toda otra medida similar de la República Argentina con efecto restrictivo o discriminatorio relativa a la importación del Uruguay de los referidos productos.
  1. Considerando que la definición del objeto del litigio presentada por el Uruguay mantiene características de generalidad, sin especificidad y presenta determinado grado de abstracción, la Argentina refuta tal definición, pretendiendo ver restringido el objeto de la demanda tan solamente a la Ley Nº 25.626, anteriormente mencionada y que se encuentra en vigor desde el día 17 de agosto de 2002.
  2. En los términos de lo dispuesto en el artículo 14 del Protocolo de Olivos, el objeto de la controversia es determinado por la presentación del pedido y su respectiva respuesta al Tribunal Arbitral, no admitiéndose alteraciones posteriores. Las alegaciones hechas por las Partes en el pedido y en la contestación deben estar vinculadas a los temas y cuestiones que hayan sido considerados en etapas previas al arbitraje, etapas estas previstas en el propio Protocolo y en el Anexo al Protocolo de Ouro Preto. Queda, por lo tanto, delimitado el objeto de la controversia por la simple verificación de los términos constantes del pedido y la respuesta de las Partes litigantes, así como de las pruebas de lo que fue discutido en las etapas de negociación anteriores al inicio del procedimiento arbitral.
  1. Los términos de discusión anteriores al arbitraje pueden ser conocidos por el análisis de los documentos traídos a autos por las Partes, cuando atendieron a lo dispuesto en el Orden Procesal Nº 1, del 23 de agosto de 2005, que determinó que fuesen acercados al proceso, a la Secretaría del Mercosur, “todos los documentos relativos a la presente controversia, inclusive el intercambio de correspondencia electrónica o epistolar – en poder de cada parte – que se hayan producido durante el proceso de negociación ocurrido previamente a la presentación por la República Oriental del Uruguay del requerimiento para la instalación de este Tribunal Arbitral”.
  1. Aún cuando los documentos elaborados por las Partes anteriormente a la instalación del Tribunal Arbitral no sean abundantes, de su examen y lectura, cotejados con los escritos presentados durante la fase arbitral, no es difícil la definición del objeto del litigio.
  1. Durante todas las negociaciones y discusiones habidas entre las Partes, quedó claro el embate entre dos principios consagrados por las normas del Mercosur y por el Derecho Internacional. Por un lado, el principio de la libre circulación de mercaderías en el Mercosur, sustentado en la eliminación de barreras no – económicas al comercio entre los Estados Miembros; por el otro lado, las normas que garanticen la preservación del medio ambiente y de la salud de las personas, animales y vegetales de la zona. En esta discusión, el punto focal se concentra en la Ley Nº 25.626, editada por la Argentina, el 8 de agosto de 2002, que prohíbe la importación de neumáticos remoldeados, extendiendo a estos la prohibición ya existente para neumáticos usados. Uruguay se manifiesta contra dicha Ley, pues entiende que su contenido es contrario a las normas del Mercosur, en la medida en que restringe injustamente el comercio, interrumpiendo un flujo comercial de neumáticos remoldeados producidos en Uruguay y que estaban siendo exportados a la Argentina.
  1. Puntos no controvertidos
  1. En el curso del procedimiento arbitral, algunos puntos fueron citados y discutidos por las Partes no siendo controvertidos. En primer lugar, se constató que había un flujo comercial de neumáticos remoldeados exportados de Uruguay para Argentina. Ese flujo, intermitente y de proporciones económicas modestas, perduró por el período comprendido entre 1997 y 2001, es decir, por cerca de cuatro años.  Tal  flujo  comercial  fue  interrumpido,  al  final  de  2001,  como consecuencia de la sanción de la Ley Nº 25.626, de 2002, por Argentina, que extendía la prohibición de neumáticos usados a neumáticos remoldeados. Por fuerza de esa norma, la libre circulación de bienes fue afectada, en el ámbito del Mercosur. Quedó comprobada la clara distinción entre los neumáticos remoldeados y los demás neumáticos reconstruidos (recapados o simplemente recauchutados). Las pruebas producidas por ambas partes dejaron claro que los neumáticos remoldeados son razonablemente seguros, no existiendo indicaciones de accidentes producidos específicamente por tales productos. Aunque haya consenso en cuanto a la seguridad de tales neumáticos, pues son libremente utilizados en ambos países, las Partes no acordaron cuanto a la durabilidad de los mismos. Existen en el proceso indicaciones de que un neumático remoldeado puede durar entre 30% y 100% de plazo de vida útil de un neumático nuevo. Es, sin embargo, hecho igualmente incontestable que un neumático para automóvil puede ser remoldeado una única vez. Las Partes no disintieron en cuanto al impacto ambiental que causan los neumáticos ya sean usados e inservibles. Se tornó un hecho indiscutido que no se dispone de tecnología adecuada y económicamente viable para el reciclaje de neumáticos usados e inutilizados. Finalmente, las Partes se declararon adeptas al principio del libre comercio en el Mercosur, y preocupadas con los problemas de medio ambiente y de la salud de las personas, de los animales y de la preservación de los vegetales que ocupan el territorio del Mercosur.
  1. Derecho aplicable
  1. Los Tribunales Arbitrales Ad Hoc instituidos en la forma prescrita por el Protocolo de Olivos, en los precisos términos del artículo 34 de ese mismo Protocolo, deben decidir las controversias a ellos sometidas en base al Tratado de Asunción, el Protocolo de Ouro Preto, a los protocolos y acuerdos celebrados en el marco del Tratado de Asunción, a las Decisiones del Consejo Mercado Común, las Resoluciones del Grupo Mercado Común, a las Directivas de la Comisión de Comercio del Mercosur y a los principios y disposiciones de Derecho Internacional aplicables a la materia en juzgamiento. El referido artículo, permite a su vez juzgar por equidad, si las Partes involucradas en el arbitraje así lo establecen.
  1. En el presente caso, no hubo acuerdo para que el Tribunal pudiese decidir ex aequo et bono, debiendo ser aplicado, por tanto, el derecho tal como fue especificado en el ítem 1 del referido artículo 34 del Protocolo de Olivos, lo que es hecho por el Tribunal. De este modo, la aplicación de normas del orden jurídico Mercosur, así como su interpretación, se realizará teniendo en cuenta, como trasfondo, los principios y disposiciones de Derecho Internacional. Para disipar cualquier duda, desde luego, el Tribunal entiende como derecho aplicable aquel instituido en los documentos firmados en el marco del Mercosur, y en los reglamentos y anexos que integran tratados, protocolos, acuerdos, decisiones, resoluciones y directivas.
  1. Los principios jurídicos en conflicto
  1. El artículo 1º del Tratado de Asunción establece como primera condición básica para el establecimiento del Mercosur la adopción del principio de la libre circulación de bienes, servicios y factores productivos entre los países, a través, entre otros, de la eliminación de los derechos aduaneros, restricciones no- arancelarias a la circulación de mercado y de cualquier otra medida de efecto
  1. Aún cuando mencione otros fundamentos legales igualmente pertinentes, el pedido de Uruguay establece su principal base legal en la violación por Argentina del principio de libre circulación de bienes en el territorio del Así, reside en el referido artículo 1º del Tratado de Asunción, o sea, en la violación de una regla esencial en que debe asentarse el Mercado Común, el planteo de Uruguay, que se pone de relieve en todas sus manifestaciones ante este Tribunal Arbitral.
  1. La Argentina, por su lado, en ningún momento contesta tal principio, resaltando su compromiso con las reglas que garantizan la libre circulación de bienes en la zona integrada, libre de restricciones o discriminaciones. Contrapone, sin embargo, al pedido de Uruguay, las excepciones legales y legítimas a la libre circulación de Menciona Argentina a su favor, entre otros fundamentos, el Preámbulo del Tratado de Asunción, cuando admite que el proceso de integración y desarrollo económico con justicia social pasa también y necesariamente por la preservación del medio ambiente. Busca, a su vez, fundamento en el Anexo I del Tratado, cuando en su artículo 2º, letra b), excluye del concepto de “restricciones al libre comercio” las situaciones previstas en el artículo 50 del Tratado de Montevideo de 1950. De este artículo 50, Argentina destaca la letra b), relativa a la aplicación de leyes y reglamentos de seguridad, y la letra d), pertinente a la protección de la vida y la salud de las personas, de los animales y de los vegetales.
  1. Por su parte, Uruguay no discute las medidas de protección ambiental, exponiendo el conjunto de normas vigentes internas relativas a tal materia, así como su actuación internacional en el sentido de proteger los valores ambientales. Destaca, no obstante, que el fundamento legal traído por la Argentina es inaplicable al caso de los neumáticos remoldeados.
  1. De este modo, el Tribunal se confronta con argumentos de las Partes que implican un verdadero confronte entre principios estructurales del Mercosur. Habiendo este Tribunal admitido como punto indiscutible la decisión Argentina de prohibir la importación de neumáticos remoldeados para su territorio, así como que tal prohibición afectó determinado flujo de comercio originado en Uruguay, la decisión a ser adoptada llevará en consideración los hechos concretos que caracterizaran el flujo de comercio de neumáticos remoldeados de Uruguay para Argentina, particularmente en el período de 1997 a 2001. Ponderará, asimismo el Tribunal la aplicación de los mencionados principios en confronto, es decir, el libre comercio y la protección del medio ambiente, definiendo la prevalencia de uno sobre el otro, teniendo en cuenta los dictámenes del Derecho Internacional y, muy especialmente, las peculiaridades del caso sub examen.

 

  1. El derecho y el caso concreto
  1. Habiendo las Partes ratificado su convencimiento en cuanto a la legalidad de la aplicación del principio de la libre circulación de bienes en la región, así como admitiendo el  hecho  de  que  determinada  Ley  interna  Argentina  prohibió  laimportación de productos que venían siendo exportados por el Uruguay, cabe a este Tribunal definir si la excepción presentada por Argentina, es decir – en términos generales –, si la protección de la salud y la vida de las personas y animales y la preservación del medio ambiente, tiene condiciones jurídicas para oponerse al principio de libre comercio, en determinadas condiciones y/o circunstancias.
  1. Además de las normas y principios antes citados, tiene referencia directa con el caso concreto ahora en análisis toda una serie de dispositivos internacionales, levantados por las Partes en el curso de las Nótese, en primer lugar, el Acuerdo General sobre Aranceles y Comercio (GATT) que dispone en su artículo XX que los Estados miembros (Argentina y Uruguay son miembros) pueden establecer restricciones a las importaciones por motivos no- económicos siempre que, como establecido en la letra “b”, sean necesarias para proteger la salud y la vida de las personas y de los animales o para preservar los vegetales. El Tratado de Asunción, como se ha visto, incorporó tal excepción al principio de libre comercio como antes mencionado.
  1. El Preámbulo del Tratado de Asunción consagra como uno de los instrumentos del proceso de integración la “preservación del medio ambiente”. Nótese, además, que se entiende como objetivo del Tratado el fin último de la mejoría de las condiciones de vida de los habitantes de la región. Es oportuno recordar que, en los términos del artículo 31.2 de la Convención de Viena sobre Derecho de los Tratados, la interpretación de un tratado ha de tener en cuenta su contexto, lo cual comprende el texto, el preámbulo y los anexos.
  1. El Consejo del Mercado Común, por la Dec. Nº 2/01, en el ámbito del Acuerdo Marco sobre Medio Ambiente del Mercosur, revela directa preocupación con el tema de la preservación del medio ambiente cuando menciona la necesidad de mejorar la calidad ambiental de la región a través de un marco jurídico que reglamente las acciones de protección al medio ambiente y la conservación de los recursos naturales de los países miembros del Mercosur. El Acuerdo Marco sobre Medio Ambiente, ya aprobado por Argentina y Uruguay, establece como sus finalidades, entre otras, la promoción de la protección al medio ambiente, la promoción del desarrollo sostenible, el tratamiento prioritario e integral de las causas y fuentes de problemas ambientales, y el fomento a la internalización de los costos ambientales. Es importante señalar que el artículo 3º del Acuerdo Marco, en el cual se incluyen las finalidades aquí mencionadas, revela preocupación con el posible choque de medidas ambientales con el flujo del libre comercio. En efecto, en la letra c), de este artículo 3º, se destaca como su objetivo la “promoción del desarrollo sostenible por medio del apoyo recíproco entre los sectores ambientales y económicos, evitando la adopción de medidas que restrinjan o distorsionen, de manera arbitraria o injustificada, la libre circulación de bienes y servicios en el ámbito del Mercosur”.
  1. Se verifica, por lo tanto, que en el Acuerdo Marco, el legislador ya previó la posibilidad de medidas de carácter ambiental afectando el libre comercio de la región, habiendo recomendado que se evitara la adopción de medidas restrictivas injustificadas o de carácter arbitrario. A contrario sensu, es posible que se admita que el mismo legislador consideró legítimas determinadas medidas de protección ambiental que, de forma justificada y no-arbitraria, puedan afectar el libre comercio de la región.
  1. En el mismo sentido, la Declaración de Río de Janeiro sobre el Medio Ambiente y Desarrollo, firmada en 1992, que ostenta como objetivos la protección de la integridad del sistema ambiental y del desarrollo mundial, admite en uno de sus principios (Principio 4) que la protección del medio ambiente debe constituir parte integrante del proceso de desarrollo y no puede ser considerada de forma aislada. Vale decir que Estados que representan a casi la totalidad de la población mundial presentes en la Conferencia de Río, conocida como Eco-92, admiten en la Declaración final que el tema de medio ambiente deberá siempre ser analizado en conjunto con otros temas vinculados al desarrollo de los pueblos. Más adelante, la misma Declaración, en su Principio 12, determina que las medidas de política comercial con fines ambientales no deben constituirse en medio de discriminación arbitraria o injustificada, ni en restricción velada al comercio Tal como en el Acuerdo Marco del Mercosur, la Declaración de Río reconoce el peligro de la utilización de los temas de medio ambiente como forma de protección comercial o de restricción al libre comercio, pero admite el empleo restrictivo de esas medidas, de forma justificada y no arbitraria. Para complementar las referencias a la Declaración de 1992 sobre el medio ambiente, cabe recordar que la misma consagró la aplicación del criterio precautorio, cuando se discuta cuestiones de medio ambiente, admitiendo que cuando hubiere peligro de daño grave o irreversible al medio ambiente, a falta de certeza científica no debe servir como motivo para la no adopción de las medidas juzgadas necesarias.
  1. En materia de derecho, Uruguay trae igualmente a la luz las Decisiones Nºs. 22/00 y 57/00 del Consejo del Mercado Común. La Decisión CMC Nº 22/00 se inserta en el proceso denominado de “Relanzamiento del Mercosur”. Su punto fundamental reside en la reafirmación del principio de la libre circulación de bienes en el territorio regional, como base de la consolidación de un mercado común. El objetivo de la decisión es de “acordar un plan de trabajo para el tratamiento de tales medidas, con miras a la eliminación de las dificultades que las mismas ocasionan en las corrientes entre los Estados Partes”. En esa línea, el artículo 1º de la Decisión ratifica la determinación de que ningún Estado Parte puede adoptar cualquier medida restrictiva al comercio recíproco. Hace entretanto, tal artículo, expresa mención a lo previsto en el artículo 2º, letra b) del Anexo I del Tratado de Asunción que, remitiendo al artículo 50 del Tratado de Montevideo de 1980, establece determinadas excepciones para la adopción de medidas restrictivas al libre comercio. En el artículo 3º, la Decisión CMC Nº 22/00 determina acciones tendientes a eliminar las dificultades generadas en el comercio intra-zona o para eliminar las medidas restrictivas al comercio justificadas por el art. 50 del Tratado de Vale decir que la Decisión, al mismo tiempo que ratifica el principio de un comercio libre y sin restricciones, acepta aquellas fundamentadas en la excepción del art. 50 del Tratado de Montevideo y establece procedimientos para la eliminación de tales medidas restrictivas, a ser adoptadas en el curso del tiempo.
  2. Por su parte, la Decisión CMC Nº 57/00 tiene por objetivo complementar la anterior Decisión Nº 22/00. Queda explícito en su texto que el libre comercio de bienes constituye un elemento esencial para la confirmación del mercado común definido en el Tratado de Asunción. De la misma forma indica la necesidad de asegurar principios fundamentales de protección a la vida y a la seguridad pública, y que las que medidas con esa finalidad no deban generar obstáculos innecesarios al comercio. Se evidencia, así, que el proceso de relanzamiento del Mercosur, corporizado inclusive en las Decisiones del Consejo del Mercosur, antes mencionadas, ratifica su compromiso con el libre comercio entre los Estados Partes, libre de restricciones o barreras no-arancelarias, pero igualmente preserva las excepciones ya previstas en documentos anteriores, proponiendo que tales excepciones sean reducidas en el tiempo.
  1. La materia ambiental se transformó en tema prioritario entre las naciones del mundo y, no podría ser diferente entre los miembros del Mercosur. Además de las normas ya analizadas, vale recordar otras tantas que, en el marco regional, tratan directamente del tema, a saber: (a) la CMC/DEC Nº 2/94, sobre el Acuerdo de Transporte de Mercaderías Peligrosas; (b) la decisión GMC Nº 10/94, que trata de las Directrices Básicas en Política Ambiental; (c) la CMC/DEC Nº 10/00 sobre la Complementación del Plano General de Cooperación y Coordinación Recíproca para la Seguridad Regional, en materia de Ilícitos Ambientales; (d) la CMC/DEC Nº 19/03, relativa a la Reunión de Ministros del Medio Ambiente, con la finalidad de crear la “Reunión de Ministros de Medio Ambiente”, que tendrá como función proponer al Consejo del Mercado Común medidas destinadas a la coordinación de políticas para promover la gestión ambiental y el desarrollo sustentable en los países del Mercosur, así como acciones de cooperación y articulación en materia de medio ambiente entre los Estados Partes; (e) la CMC/DEC Nº 14/04, que aprueba el Protocolo Adicional al Acuerdo Marco sobre Medio Ambiente del Mercosur en Materia de Cooperación y Asistencia frente a Emergencias
  1. Límites al Derecho de la Integración
  1. La disposición política de los países que componen el Mercosur en la búsqueda de la integración regional ha oscilado en curso de los años, desde la firma del Tratado de Asunción. Contingencias y circunstancias específicas dictan los vientos favorables y, por veces, menos favorables a la consolidación y al perfeccionamiento de esa zona comercial integrada. Entretanto, si la temperatura política ha variado, lo mismo no se puede decir de la coherencia y consistencia del sistema legislativo que instrumenta el Mercosur. Los Estados Miembros respetan y hacen respetar las normas vigentes; hay un incesante trabajo de perfeccionamiento de normas y sistemas del proceso de integración; hay una constante preocupación con la solución de eventuales controversias surgidas entre los miembros, siendo el Protocolo de Olivos el mejor testimonio de esa afirmación.
  1. Los principios de integración son reiteradamente reconocidos por todos los miembros del Mercosur, habiendo sido inclusive ratificados por diversas manifestaciones de Uruguay y Argentina en varios momentos de este proceso arbitral. Fundada en el libre comercio, sin restricciones o barreras, la sistemática jurídica de la integración igualmente convive con los principios de proporcionalidad, de la limitación de reserva de soberanía, de la razonabilidad y de la previsibilidad comercial. Por cierto, la búsqueda de la integración y la consagración de su fundamento en el libre comercio sólo pueden tener sentido como instrumentos de implementación del bienestar de los seres humanos que viven en la región. Léase bienestar como un concepto amplio, que implica todos los elementos que contribuyen para mejorar la calidad de vida de los En este cuadro, el libre comercio no puede gozar de una prioridad absoluta, puesto que es instrumento del bienestar humano no un fin en si mismo. El concepto de un mercado libre de barreras debe ser temperado con otros principios, igualmente consagrados por el Derecho, tales como la eficiencia, la cooperación entre los pueblos, la preservación del medio ambiente, la prevención, la precaución, entre otros.
  2. Para comenzar, hay un objetivo común en la formulación de políticas para incrementar la mejor distribución de recursos económicos y naturales disponibles, así como de los recursos adicionales resultantes del desarrollo económico. Se destinan tales políticas a la eliminación de barreras que perjudiquen el flujo comercial y las inversiones realizadas en países en desarrollo; a la transferencia de tecnología, inclusive para el tratamiento de problemas ambientales internos; al desarrollo de la capacidad de los países de crear y perfeccionar tecnologías propias, inclusive de preservación ambiental; a la integración de políticas económicas, ambientales y sociales, entre otras finalidades. En este marco, el principio de eficiencia impone una distribución racional de los recursos y se propone garantizar que los costos involucrados en el proceso de integración efectivamente sirvan para incrementar un régimen de comercio desarrollado y competente.
  1. El principio de la cooperación internacional exige que los regímenes comerciales en desarrollo promuevan vínculos más allá de las fronteras, buscando el perfeccionamiento de los sistemas internacionales de cooperación. La cooperación regional debe desempeñar un papel fundamental en el desarrollo de la capacidad de cada país incluido en la región para administrar sus problemas ambientales. La cooperación y el apoyo recíproco entre políticas económicas y ambientales es esencial para el desarrollo seguro y sustentable de la región. Por su parte, el principio de integridad ambiental consagra que la falta de certeza científica no puede ser utilizada como motivo o justificación para postergar la adopción de medidas y programas tendientes a evitar posibles o potenciales daños al medio ambiente.
  2. En consonancia con el principio de integridad ambiental, el principio precautorio determina que el poder público utilice criterios científicos objetivos que conduzcan al equilibrio entre la toma de decisiones para resultados a largo plazo y la satisfacción de necesidades de corto plazo. Debe haber una permanente integración entre la formulación de políticas ambientales y la investigación científica. La ciencia funciona como colaboradora esencial para justificar medidas de protección al medio ambiente y sirve como base para formular el desarrollo de políticas ambientales. Es cierto, entretanto, que el conocimiento científico sobre determinados ecosistemas y las consecuencias de la acción del hombre sobre la naturaleza son todavía incipientes y precarios. No se culpe a la ciencia por tal atraso, pues la efectiva y diseminada preocupación con la defensa y preservación del medio ambiente y de los recursos naturales surge apenas en la segunda mitad del siglo 20. La llamada incerteza científica debe ser ponderada en la discusión de medidas y políticas destinadas al medio ambiente. Es de sentido común que la ciencia no siempre es capaz de ofrecer las pruebas necesarias para comparar – con certeza – los efectos potenciales o futuros que determinada actividad humana pueda causar al medio ambiente. Así, forzoso es admitir la necesidad de incorporación de esa “incerteza científica” como componente de políticas ambientales.
  1. El principio de precaución es corolario de la constatación de incerteza científica ante la necesidad incuestionable del implemento de políticas La precaución determina que el objetivo de protección al medio ambiente no puede ser perjudicado por la falta de certeza científica. La fragilidad y la vulnerabilidad de la naturaleza son realidades incontestables y los límites humanos de la ciencia no pueden servir de justificativo para postergar la protección del medio ambiente. No siendo la incerteza científica un obstáculo para la toma de medidas de precaución y defensa, se procedió a invertir la carga de la prueba, a fin de que la parte que pretenda implantar una actividad considerada nociva o potencialmente peligrosa al medio ambiente probar que la misma es segura y no constituye un peligro ecológico. En esa línea de conducta, una incerteza científica certificada, por si sola, puede justificar la adopción de medidas de resguardo al ambiente. Finalmente, la prevención viene consagrada por el moderno derecho internacional y particularmente por las normas del Mercosur, incluidas estas en el Acuerdo Marco de Medio Ambiente. Tal principio consiste en la autorización para la toma de medidas destinadas a evitar y prevenir riesgos potenciales.
  1. La prueba producida por las Partes
  1. Las Partes sometieron a este Tribunal Arbitral un conjunto probatorio amplio y bien elaborado. Fueron documentos, datos estadísticos, gráficos, consideraciones técnicas, además de presentación y la declaración de peritos hechas en el curso de la Audiencia del día 11 de octubre de 2005. Como ya se tuvo oportunidad de mencionar, varios aspectos fácticos, objeto de las referidas pruebas, se tornaran indiscutidos.
  2. No existe divergencia entre las Partes con relación de la distinción existente entre un neumático nuevo, un neumático usado y un neumático remoldeado. Se deja de lado el análisis de otros tipos de reconstrucción de neumáticos, pues la controversia gira exclusivamente en torno de los remoldeados. La prueba traída al proceso indica que el neumático remoldeado es un producto que se utiliza de una carcasa de neumático usado, debidamente inspeccionada y que esté en buen estado, sobre la cual se reconstruye un neumático, abarcando esa reconstrucción la banda de rodaje, los hombros y los laterales del neumático.
  1. En cuanto a la seguridad para el usuario de un neumático remoldeado, aún cuando las Partes puedan haber discordado en algunas particularidades del tema, las pruebas indican que tal tipo de producto no trae inseguridad en su uso en el tráfico normal. Se informa que ese proceso de reconstrucción es utilizado en neumático para camión es, especialmente, para aviones, lo que indica la confiabilidad del mismo. Además, la Argentina produce y admite el uso en sus territorios de neumáticos remoldeados, habiendo – según se informó en el proceso – decenas de industrias trabajando en esa fabricación. Así, el hecho de que la Argentina admita el uso en su territorio nacional de productos allí reconstruidos elimina, a los efectos de este proceso, la necesidad de mayor discusión en cuanto a la seguridad del producto.
  2. Entretanto, en cuanto al aspecto de durabilidad, no hubo acuerdo entre las Partes. El Uruguay presentó conclusiones técnicas del IPT (Instituto de Investigaciones Tecnológicas, vinculado a la Universidad de São Paulo), que a través de un informativo del 24 de noviembre de 1997 (Nº 067), concluye que un neumático reformado “es un neumático remanufacturado a través de un proceso industrial que utiliza la estructura íntegra de los neumáticos usados, luego de una rigurosa inspección. (….) El neumático así obtenido posee, en principio, las mismas características del neumático nuevo, teniendo inclusive que atender a los requisitos exigidos para neumáticos nuevos, de acuerdo con as normas brasileñas. De esa forma, adecuadamente fabricado, el neumático remoldeado tiene la misma durabilidad y sería tan o más seguro que un neumático nuevo, utilizado en las mismas condiciones” (ver Anexo nº 33, del pedido de Uruguay. Subrayado propio).
  3. En contrapartida, la Argentina trajo manifestaciones del (Instituto Nacional de Tecnología Industrial INTI), en la cual declara que la duración “de un neumático reconstruido depende de su tamaño y del modo en que fue Lo que está claro es que la probabilidad de falla del mismo es mucho mayor que la de un neumático nuevo por el envejecimiento que tiene la carcasa (neumático usado sobre el que se realiza la reconstrucción). (   ) El rendimiento se estima, con base más práctica que técnica en un 30% de la vida útil de un neumático nuevo, pero depende mucho del estado del neumático usado en el momento de la selección y de la calidad del proceso de reconstrucción”. (ver Anexo 7.1, de la contestación de la Argentina. Subrayado propio ).
  1. Además de la divergencia presentada por los dos institutos técnicos en lo relativo a la durabilidad de los neumáticos remoldeados, las Partes presentaron ante el Tribunal Arbitral una discusión técnica sobre resistencia a la abrasión de tales Uruguay presentó un Informe de Ensayo sobre el nº 878467/CUE, de responsabilidad de LATU (Laboratorio Tecnológico del Uruguay), relativo a los resultados de un experimento de resistencia a la abrasión de los neumáticos remoldeados en comparación con los nuevos, realizado según la norma DIN 53516. El resultado es expresado por la medida de volumen de goma perdida por los neumáticos utilizados durante las pruebas. En el caso de esa experiencia, el LATU utilizo un neumático nuevo CEAT y un neumático remoldeado RALF, habiendo concluido que, después de estos análisis con ambos, el neumático CEAT (nuevo) perdió 157 mm3 de goma y el neumático RALF (remoldeado) sufrió una pérdida de 145mm3. Por la diferencia poco significativa de desgaste entre ambos productos testados, concluye el LATU que la vida útil de un neumático RALF remoldeado es similar al de un neumático CEAT nuevo. (ver Anexo 27, del pedido del Uruguay).
  2. Sobre las pruebas realizadas por el LATU y las respectivas conclusiones, el INTI manifestó, opinando que “la medición del desgaste de la banda de rodamiento de los neumáticos se realiza a través de prolongadas pruebas en flotas de autos, camiones, entre otras, en los que se mide la disminución de la profundidad de la banda de rodamiento (desgaste) a lo largo de miles de kilómetros. ( ) El ensayo de abrasión según la norma DIN 53516 no es suficiente por sí mismo para garantizar la equivalencia de los compuestos para banda de rodamiento. En general, con un único ensayo es imposible concluir que dos compuestos de caucho son equivalentes.  El  ensayo  de  abrasión  antes  señalado  compara  desgaste  por frotamiento en condiciones controladas, pero su correlación con las condiciones de servicio es muy pobre”. (ver Anexo 7.1, de la contestación de Argentina).
  1. De la misma forma, no fueron conclusivas las declaraciones prestadas por los peritos de ambas Partes en lo que se refiere a la durabilidad de los neumáticos remoldeados. Recuérdese que, en las declaraciones de los peritos indicados por la Argentina, Dr. Jorge Mandelbaum y Lic. Liliana Rehak, también no consiguieron ser precisos en cuanto al tema. Preguntados sobre la durabilidad del producto referida por el INTI, afirmaron que no se trata de que duren cerca de 25% a 30% de un neumático nuevo, y sí que presenten problemas estructurales antes inclusive que se desgaste la nueva banda. (ver declaración de los peritos Mandelbaum y Rehak).
  2. Quedó finalmente, comprobado que un neumático remoldeado es prácticamente tan seguro en su uso como un neumático nuevo. Que un neumático remoldeado tiene durabilidad de entre 30% y 100% de la de un neumático nuevo. Que un neumático remoldeado es más barato que un neumático nuevo. Que un neumático remoldeado no puede ser nuevamente remoldeado.
  3. En este punto, son necesarias consideraciones sobre la prueba realizada en lo referente a los daños ambientales producidos por los neumáticos usados, cuando sean transformados en residuos. Las alegaciones traídas al proceso, los documentos juntados por la Argentina y, además las declaraciones de las peritas indicadas, Dra. Leila Devia y Dra. Raquel Turcán, no fueron contestadas en su contenido por el Uruguay. Además, parece indudable que, al final de su vida útil, sean neumáticos nuevos, sean neumáticos remoldeados, tales productos causan o pueden causar daño al medio ambiente y, particularmente a la salud de las personas, de los animales y la preservación de los Un neumático, al final de su vida útil, no dispone, aún de un proceso de reciclaje económicamente viable, no obstante los varios estudios que mundialmente son realizados en ese sentido. Un neumático, al fin de su vida útil, se transforma en residuo indeseable y potencialmente peligroso. Los neumáticos inservibles vertidos al aire libre, transformándose en fuente de contaminación y verdaderos criaderos de insectos. Además de esa consecuencia, pueden tales residuos liberan elementos de su composición dañosos a la salud de seres vivos y a la naturaleza, inclusive contaminando a las aguas. Pueden también los neumáticos al fin de su vida útil ser enterrados en rellenos sanitarios, especialmente reservados para tal finalidad. Vertidos en el subsuelo, se estima que tales productos lleven cerca de 500 años para degradarse en la naturaleza. En ese período, los rellenos que reciben neumáticos inservibles pueden, con la liberación del proceso de degradación, contaminar gravemente la superficie freática, alcanzando a las aguas subterráneas, con consecuencias dañosas para el medio ambiente.
  4. La posición de Uruguay, durante el curso del proceso, fue – la mayor parte de las veces – no debatir el problema ambiental. El argumento de resistencia del pleito uruguayo, en cuanto a ese tema, fue en ese sentido de que, se trata de neumáticos nuevos, usados y remoldeados, al final de su vida útil se transforman en carcasas inservibles y causan iguales peligros a la salud de las personas y al medio ambiente. No se trata, en este arbitraje, argumentan los pedidos de Uruguay, de discutir la importación de neumáticos usados, y sí neumáticos remoldeados, que serán destinados al uso y no inmediatamente transformados en residuos ambientalmente problemáticos. La pretensión de Uruguay se restringe a obligar a Argentina a seguir importando neumáticos remoldeados producidos en Uruguay, puesto que estos tienen igual durabilidad y seguridad en relación a los neumáticos nuevos, siempre tuvieron libre ingreso en el territorio argentino y no significan un impacto ambiental distinto del que es causado por el neumático
  1. El estoppel
  1. El Uruguay pretende que sea aplicado al caso el principio de estoppel. Afirma que la Ley Nº 25.626 suspendió el comportamiento comercial constante de la Argentina, relativo a admitirla importación de neumáticos remoldeados de Uruguay, causando a éste perjuicios de naturaleza económica. Tal comportamiento, en las circunstancias en que se dio, encierra la aplicación del principio. El estoppel ha sido aplicado como forma de dar estabilidad, certeza y continuidad a las obligaciones internacionales, sean ellas – o no – convencionales. El principio  reconocido  por  la  jurisprudencia  internacional  en  varias oportunidades, no goza de unanimidad en cuanto al alcance de su concepto, por la doctrina. La propia expresión estoppel incluye y admite otras denominaciones equivalentes relativas a sus efectos, aún cuando no siempre en cuanto a su naturaleza. Así no será difícil encontrar para el mismo principio (o muy semejante a él) denominaciones como “doctrina de los actos propios”, “venire contra factum proprium non valet or non licet”, “preclusión”, “doctrina de la apariencia”, “adversus factus suum quis venire non potest”, entre de otras.
  1. Para Ian Browlie1, el estoppel es un principio general del derecho internacional, fundado en la buena fe y en la consistencia de las relaciones internacionales. Schachter entiende la aplicación del principio cuando una parte que se compromete de buena-fe a adoptar un cierto comportamiento o a reconocer una determinada situación jurídica, se torna impedida por el estoppel de proceder en contradicción con ese compromiso o con esos actos, si las otras partes tienen razonablemente fundado su propio comportamiento en ese compromiso.2 En esa línea, vale todavía recordar el concepto de estoppel más recientemente propuesto por Francisco Jiménez García, al entender que “el estoppel supone la reprobación de la contradicción. No de cualquier contradicción, sino de aquella que pone en entredicho la coherencia y la consistencia de los Estados en la realización de sus comportamientos y conductas en el marco de una determinada situación o relación jurídica internacional. Mediante ese principio se impide que un Estado reclame para sí la observancia de un derecho de que es titular o el ejercicio de una facultad admitida por el Derecho, si tal pretensión resulta contraria con la conducta anteriormente observada por el mismo respecto al contenido de ese derecho o al ejercicio de las facultades que lo integran o que el Derecho reconoce e incompatible con las legitimas expectativas originadas en el patrimonio jurídico del Estado los Estados que, de buena fe y de forma razonable, han confiado en la veracidad de la conducta primaria y han acomodado sus intereses de conformidad con el nuevo estado de cosas así creado”.3

1 Ian Browlie, Principles of International Public Law, 5th ed., Oxford University Press, 1998, p. 646.

2 Oscar Schachter, Droit International, Bilan et Perspectives, org. Mohammed Bedjaoui, Tomo 1, Paris, 1991.

3 Francisco Jiménez García, Los comportamientos recíprocos en Derecho Internacional: A proposito de la aquiescencia, el estoppel y la confianza legítima, Editorial Dilex, Madrid, 2002, p. 236.

  1. Aún un tratamiento cuidadoso por la doctrina, el estoppel ha sido aplicado de formas diversas por la jurisprudencia. No es necesario un esfuerzo mayor de investigación para que se encuentre en el repertorio internacional las más variadas interpretaciones y aplicaciones del principio. Desde luego, recuérdese el Laudo Arbitral, dictado el 9 de enero de 2002, sobre la “Prohibición de Importación de Neumáticos Remoldeados (Remolded) procedentes de Uruguay”, al proclamar que “en el marco de las opiniones doctrinarias citadas por la Reclamante, el Tribunal entiende que la señalada concurrencia de elementos contestes – tráfico comercial, declaraciones oficiales, a más de los concordantes actos concluyentes de órganos del Estado justifican la invocación del principio del estoppel que realiza la Parte Reclamante”. Por otro lado, en el caso Comunidades Europeas (CEE) – Bananas I, el Grupo Especial (GATT 1947) concluyó que el estoppel solamente puede resultar del expreso o, en casos excepcionales, implícito, consentimiento de las partes 4 Y, todavía, en los casos Comunidad Europea (CE) – Asbestos y Guatemala – Cemento II, los Grupos Especiales declararon que el estoppel es relevante cuando la parte confía razonablemente (“reasonably relies”) en las garantías de la otra parte y, así, sufre consecuencias negativas resultantes del cambio de posición de esa otra parte.5
  2. El estoppel, para su caracterización debe contener, como mínimo, tres elementos esenciales: (a) una situación creada por un Estado, entendida como conducta primaria; (b) una conducta seguida por otro Estado, entendida como conducta secundaria y (3) la imposibilidad por parte del Estado que adoptó la actitud primaria de comportarse o manifestarse en sentido contrario a Se trata de un principio directamente vinculado a la buena fe, puesto que quien afirma o admite algo es, aún más, cuando por una serie de actos, hechos u omisiones consagra la afirmación o admisión, no puede contradecir ese comportamiento. En materia de decisiones relacionadas al comercio, además de los casos referidos en el ítem 86, supra, debe ser mencionado el Panel Report de

4 Relatório do Grupo Especial: EEC – Member States’ Import Regimes for Bananas (EEC – Bananas I),junho de 1993 – DS32/R.

5 Relatório do Grupo Especial – European Communities – Measures affecting asbestos and asbestos- containing products (EC-Asbestos), WT/DS 135R, modificado pelo Relatório do Órgão de Apelação, WT/DS135/AB/R, para 8.60 e Relatório do Grupo Especial – Guatemala – Definitive anti dumping measures on Gray Portland Cement from México, WT/DS156R, pars. 8.23 e 8.24.

caso Argentina – Derechos Antidumping relativos a Pollos de Brasil (WT/DS241/R), decidido en mayo de 2003, donde se menciona el principio del estoppel y se admite su aplicación en aquellas circunstancias en que (i) una declaración de hecho clara y no ambigua, que (ii) sea voluntaria, incondicional y autorizada es (iii) admitida de buena fe.

  1. El estoppel, práctica consagrada en la jurisprudencia como resultantes de buena fe y del pacta sunt servanda, encuentra abrigo indirecto en la Convención de Viena sobre Derecho de los Tratados, cuando en su artículo 45, letra b), considera tener un Estado admitido a validez de un tratado, inclusive en razón de su conducta previa. Vale decir que actos u omisiones del Estado en consonancia con determinado Tratado son suficientes para obligar tal Estado por los términos del mismo.
  2. En el caso en juzgamiento, cabe al Tribunal verificar si hubo, por parte de la Argentina, acto propio generador de obligaciones frente a Uruguay, así como analizar si el comercio de neumáticos remoldeados existente entre las Partes habría sido suficiente para configurar una práctica de naturaleza comercial constante y regular, apta para generar en otro Estado una justa expectativa de la existencia de una obligación de naturaleza internacional. Por el lado del segundo Estado, en este caso, el Uruguay, debe el Tribunal igualmente verificar si, habiendo tal práctica comercial constante y regular, fue ella suficiente para, a partir de una justa expectativa, determinar la adopción de postura específica, en consecuencia de los actos practicados por la otra Parte, así como si el cambio de comportamiento comercial de la Argentina habría generado perjuicios a Uruguay. Finalmente, y no menos importante, aún admitiéndose la existencia de requisitos suficientes para configurar la aplicación del principio del estoppel, cabe indagar si tal principio es absoluto y no sufre alguna restricción. Vale decir que cabe examinar si la obligación generada en consecuencia de la conducta de un determinado Estado y que, por fuerza del estoppel, debe ser mantenida, tiene carácter absoluto. O sea, si el Estado practicante de conducta primaria no tiene derecho de suspender tal conducta, si y cuando otros principios, o motivos fundamentales antes desconocidos, muestren la necesidad o conveniencia de alterar o paralizar la conducta original.
  1. CONCLUCIONE
  2. Ante lo expuesto y analizado, el Tribunal Arbitral, por mayoría de votos de los Señores Árbitros, decide lo cuanto articuladamente a seguir se declara.
  3. En cuanto al objeto de la controversia, reportándose lo que fue relatado en el ítem 42 y siguientes, retro, el Tribunal decide que, primeramente, se trata de la Ley Nº 626, promulgada por la Argentina, de fecha de 8 de agosto de 2002, que prohibió la importación de neumáticos remoldeados para su territorio. Sin embargo, lo que aquí se discutió no fueron los aspectos formales de tal mandamiento normativo y sí su contenido, así como el impacto de ese contenido sobre el comercio bilateral de las Partes. Sería poco lógico – y aún ingenuo – admitir que este Tribunal pudiese, por hipótesis, considerar inaplicable a la referida Ley, admitiendo, no obstante, que la Argentina editase otro acto normativo con igual tenor o contenido. La buena fe, para no decir el buen sentido, indican que la discusión entre las Partes, tanto en este Tribunal, como antes de él, siempre se basó en la prohibición de importación de neumáticos remoldeados por la Argentina, prohibición esa instrumentada en referido texto legal.
  4. En base a lo expuesto, este Tribunal define el objeto del litigio como siendo la prohibición impuesta por la Argentina a la importación de neumáticos recauchutados (remoldeados) para todo su territorio nacional. La referida prohibición fue establecida por la Ley Nº 626 de 2002. Sin embargo, además de tal norma, se incluye en el objeto de la controversia cualquier otro texto legislativo o administrativo que tenga o venga a tener, en la práctica, los mismos efectos de la citada Ley.
  5. Establecido con claridad el objeto de la controversia, cabe ahora, teniendo en cuenta los hechos narrados y comprobados por las Partes y las normas legales aplicables, juzgar si hubo por parte de Argentina una práctica reprobable y violadora de los principios que rigen las relaciones entre los Estados que componen el Mercosur.
  6. El Tribunal ratifica el entendimiento de las Partes en el sentido de que el artículo 1º del Tratado de Asunción, así como todo el cuerpo legislativo que se creó en el Mercosur, consagra como base para el establecimiento de ese mercado regional la adopción y el respeto al principio de la libre circulación de bienes, servicios y factores productivos entre los países, suprimiéndose lo derechos aduaneros, restricciones no-arancelarias y cualquier otra medida de efectos equivalentes. Por su parte, el artículo 1º del Anexo I al Tratado de Asunción define restricciones a la libre circulación de bienes, como “cualquier medida de carácter administrativo, financiero, cambiante o de cualquier naturaleza, mediante la cual un Estado Parte impida o dificulte, por decisión unilateral, el comercio recíproco”.
  7. En este contexto, el Tribunal entiende que la Ley Nº 25.626, al prohibir la importación de neumáticos remoldeados, interrumpió el comercio internacional de tales productos, y particularmente las exportaciones de Uruguay para la Argentina, que se desarrollaban, en cuanto a tales neumáticos, desde el año de
  8. Sin embargo, la libertad de comercio y su preservación como forma de estructurar el Mercosur no puede ser considerada principio absoluto y inderogable, un verdadero deus ex machina surgido para solucionar todos los problemas de las relaciones comerciales e inmune a cualquier excepción.
  9. Las Partes no discreparon del hecho de que, al final de su vida útil, los neumáticos se transforman en un problema Los residuos resultantes de esos neumáticos usados son de difícil disposición, tardan siglos para degradarse, son compuestos por innumerables elementos químicos y pueden provocar serios daños al medio ambiente, al hombre, a los animales, a la naturaleza en general, si abandonados al aire libre. Igualmente, pueden perjudicar la superficie freática, alcanzando el subsuelo, cuando son dispuestos en rellenos sanitarios. Quedó igualmente exenta de duda la afirmación de que un neumático solamente puede ser remoldeado una única vez y que, en esa condición, presenta niveles de seguridad comparables a un neumático nuevo. En el plazo de vida de un neumático remoldeado reside el punto fundamental de esta cuestión.
  10. Aún cuando los laudos de los institutos técnicos de elevada reputación en sus respectivos países (INTI e IPT) diverjan cuanto a la durabilidad de un neumático remoldeado, debe quedarse en el espectro establecido por esos análisis. Vale decir, un neumático remoldeado dura, un mínimo, de 30% de vida de un neumático nuevo y, como máximo, tiene una vida igual a éste. No obstante las Partes no hayan logrado probar de manera convincente la durabilidad de un neumático remoldeado, la admisión de que su vida útil pueda oscilar entre el 30% del INTI y el 100% del IPT, en relación a la vida de un neumático nuevo, es suficiente para fundamentar la decisión de este Tribunal, como más adelante se verá.
  11. La reconstrucción de un neumático es una medida saludable y debe ser incentivada, pues reduce (o mejor, retarda) la acumulación de neumáticos usados. Lo que se discute y contesta, no obstante, es la conveniencia de importación de neumáticos remoldeados de otro país o región. Las pruebas traídas por las partes indican, a modo de ejemplo, que un neumático nuevo debe rodar aproximadamente 60.000 kilómetros. Con la posibilidad de su remoldeado, y en la expectativa más optimista revelada por el IPT, tiene un rodaje adicional de 60.000 kilómetros. Al fin del período, el neumático se transforma en residuo ambientalmente problemático.
  12. En una simple operación aritmética y, partiendo de la expectativa optimista de que un neumático remoldeado pueda rodar los mismos 60.000 kilómetros que uno nuevo, se concluye que, al final de 120.000 kilómetros, un vehículo de cuatro ruedas que haya usado neumáticos nuevos y en seguida remoldeados, habrá consumido cuatro neumáticos; por otro lado, un vehículo idéntico que hubiera utilizado remoldeados, en el mismo periodo, tendrá utilizado ocho neumáticos. Es obvio que, si la vida útil total de un neumático remoldeado fuera menor de la de un nuevo (pues éste puede ser remoldeado una vez y aquel no), con el ingreso en el mercado nacional de neumáticos remoldeados en el exterior, el pasivo ambiental será incrementado en el tiempo.
  13. En este contexto, la importación de neumáticos remoldeados implica para el país importador la aceleración de su pasivo La protección del medio ambiente es un principio básico para el Mercosur. Como ya se explicitó anteriormente, el Preámbulo del Tratado de Asunción y la aplicación del artículo 2º, letra b) del Anexo I del Tratado, que incorpora el artículo 50 do Tratado de Montevideo de 1980, son pruebas inequívocas de que el Mercosur nació y debe desarrollarse protegiendo la vida y la salud de las personas, de los animales y de los vegetales. No habría razón para el ejercicio del libre comercio y el consecuente desarrollo económico y social de los pueblos de los países del Mercosur, si estos pueblos fuesen condenados a vivir en condiciones ambientalmente comprometidas por la acción agresiva del hombre. En el mismo sentido, fueron recordados en esta sentencia el artículo XX del GATT que admite restricciones al comercio internacional por motivos no económicos, en cuanto tales restricciones son impuestas para la protección de la salud y vida de las personas y de los animales y para preservar los vegetales. El Acuerdo Marco sobre Medio Ambiente del Mercosur, aprobado en el 2001, establece entre de sus finalidades la protección al medio ambiente. En el mismo sentido está la importante Declaración de Río de Janeiro sobre el Medio Ambiente y Desarrollo, firmada en 1992, determina que el tema del medio ambiente no puede ser considerado de forma aislada, siendo necesaria su aplicación dentro del cuadro mayor de las relaciones internacionales.
  1. Reconocida la importancia fundamental de la protección al medio ambiente y adoptados los principios que orientan la aplicación de las normas de Derecho Ambiental, especialmente los principios de la cooperación entre los pueblos, preventivo y precautorio, como anteriormente fue analizado (ítem 68 y siguientes), el Tribunal entiende que la defensa del medio ambiente, desde que esté fundada en justas razones, puede ser usada como excepción a las normas generales de la integración regional y, particularmente, aquellas que regulan el libre comercio entre los países del Mercosur.
  2. Las reiteradas alegaciones de Uruguay de que exporta para Argentina neumáticos remoldeados para ser usados y consumidos y no neumáticos usados para ser lanzados a la basura, aún cuando – en un primer momento – pueda causar impacto, no resiste a un análisis más De hecho, lo que produce y exporta Uruguay son neumáticos reconstruidos a partir de carcasas generalmente importadas de países desarrollados. El neumático remoldeado no es en sí mismo un producto que pueda causar daño inmediato al medio ambiente. Sin embargo, ese mismo producto reconstruido, con estructura originaria de otras regiones del mundo, tendrá una vida útil sustancialmente menor que la de uno de un neumático nuevo. Vale decir que será transformado en basura más rápidamente y hará que el Estado receptor acumule precozmente residuos dañosos al medio ambiente para los cuales la ciencia y la tecnología todavía no encontraron solución satisfactoria.
  3. En el caso presente, siendo incuestionable el daño causado por los residuos de los neumáticos inservibles al medio ambiente y siendo, igualmente, inmune a las dudas que el ingreso en determinado país de neumáticos remoldeados incrementa su pasivo ambiental, cuando se compara tal incremento con el que sería causado por neumáticos nuevos, Argentina tuvo justa razón para aprobarla Ley Nº 626, del 2002 y, por medio de ella, impedir el ingreso al país de neumáticos usados, recapados o remoldeados.
  4. No ve el Tribunal, en el presente caso, posibilidad de aplicación del principio de estoppel. En secuencia en la de lo que fue analizado anteriormente (ítem 82 y siguientes, retro), la prevalencia del estoppel en el presente caso dependería de la existencia de un flujo o práctica comercial suficientes para generar la expectativa de que se constituía una obligación internacional. Tal como fue discutido, también cuanto la aplicación de estoppel puede investigarse si tal principio debe prevalecer de forma absoluta, inclusive sobre otros de igual o mayor trascendencia. Para verificar el punto primero, se recurre al Acuerdo sobre Subsidios y Medidas Compensatorias Relativo a la Aplicación del Artículo VI del GATT 1994, cuando en el primer acuerdo, en su artículo 6, al referirse a “perjuicio grave” determina que para que éste se configure debe ser analizada la corriente comercial “durante un período apropiadamente representativo, suficiente para demostrar tendencias claras en la evolución del mercado”. El artículo 2.2.1 del segundo acuerdo referido determina que para un comercio ser considerado como base para determinar el valor normal de un producto, esa evaluación debe haber tomado como base “un periodo prolongado y en cantidades substanciales”.
  5. Compilándose los datos presentados por las Partes al proceso, se verifica que, según lo informado por Uruguay (Anexo 18), fueron exportados, en neumáticos remoldeados, durante el año de 1998, el valor de US$ 168,740; durante el año 1999, US$ 215,480; durante el año 2000, US$ 632,524; durante el año de 2001, el valor de US$ 225,241 y durante el año 2002, el valor de US$ 235,842. No está claro en el cuadro presentado por el Uruguay el destino de esas exportaciones. Tales operaciones, según el Uruguay, ocurrieron durante 8 meses en el año 1998; durante 9 meses en el año 1999; durante 11 meses en el año de 2000; durante 3 meses en el año 2001 y durante 4 meses de los primeros ocho meses de 2002, cuando fue promulgada la Ley Nº 25.626. Igualmente, al mencionar tales períodos, no se especifica el destino de las exportaciones.
  6. Por su parte, Argentina informa en el cuadro estadístico (Contestación presentada, Cuadros de comercio entre las partes y otros) que las importaciones de neumáticos remoldeados del Uruguay fueron las siguientes: en valor de US$ 28,306 para el año 1977; en valor de US$ 4,317 en el año 1998; en valor de US$ 20,450 en el año 1999; en valor de US$ 400,431 en el año 2000 y en valor de US$ 103,985 en el año 2001, no siendo declarado ningún movimiento para el año de 2002. Mencionan todavía los cuadros presentados por la Argentina que las operaciones con neumáticos remoldeados con el Uruguay ocurrieron durante dos meses en el año 1997, un mes en el año 1998, dos meses en el año de 1999, diez meses en el año de 2000 y tres meses en el año 2001.
  7. Aunque usando criterios distintos, a las informaciones presentadas por las Partes permiten al Tribunal esbozar un cuadro realista del efectivo flujo comercial entre las Partes representado por los neumáticos remoldeados en el período comprendido entre 1997 y 2001. Se constata que el comercio de tal producto no fue permanente y estable y, con la excepción del año 2001, no hubo mayor impacto económico. Además se verifica de las estadísticas presentadas por el Uruguay aún después de la vigencia de la ley Argentina y consecuente prohibición de exportar neumáticos remoldeados para la Argentina, hubo gran incremento de exportaciones uruguayas de tales productos para otros destinos. De este modo, de una forma general y comprensiva, no se puede afirmar que la industria uruguaya de neumáticos  reconstruidos,  como  un  todo,  haya  sufrido  impacto  negativo después la prohibición de importaciones por la Argentina. No se cumple, por tanto, el primer requisito para la aplicación del principio de estoppel, puesto que no se ha comprobado en estos autos un flujo mercantil permanente, ni tampoco cuantidades substanciales en las exportaciones. Finalmente, los números presentados indican un crecimiento en el mercado uruguayo de producción de neumáticos remoldeados, como consecuencia del incremento de exportaciones de ese producto, no comprobándose igualmente perjuicios en el sector productivo relevante.
  8. En cuanto a la relativización del estoppel ante otros principios jurídicos con el fin de justificar, como en el caso presente, una restricción de carácter no- económico al libre comercio de la región, deben ser recordados los argumentos anteriormente expuestos ( ítem 99) que fundamentan el indiscutible compromiso del Mercosur con la preservación de medio ambiente y, muy especialmente, con la protección de la vida y la salud de las personas, de los animales y de los vegetales. Aún corriendo con el riesgo de pecar por exceso, el Tribunal debe recordar que no obstante la constatación de “incerteza científica”, que puede ser comprobada con varias manifestaciones de las Partes en este proceso, además de las afirmaciones concretas sobre seguridad, durabilidad y forma de disposición de neumáticos, es aplicado al caso los preceptos relacionados a los principios precautorio y preventivo, que permiten la utilización de medidas restrictivas de carácter no económico al comercio internacional y relativamente a determinado producto, aún cortando un flujo comercial anterior permanente y substancial. Concluyendo, el Tribunal entiende no ser aplicable el principio de estoppel en el caso presente, no solo porque los antecedentes comerciales no son significativos, sea por su valor económico absoluto, sea por la falta de permanencia continua de ese comercio, como también por la admisión de que hay (y debe haber) principios superiores que, debidamente comprobados, permiten al Estado imponer restricciones no económicas en su comercio internacional.
  9. En apoyo de la legalidad de su reclamación, el Uruguay trae una jurisprudencia creada en el Mercosur por la decisión del Tribunal Arbitral que decidió, el 9 de enero de 2002, el caso denominado “Prohibición de Importación de Neumáticos Remoldeados (Remolded) Procedentes de Uruguay”. De hecho, tal caso guarda – en su esencia – gran semejanza con este que se encuentra bajo juzgamiento. También en aquella oportunidad, alegando el mantenimiento de reglas que garantizan el libre comercio en el espacio del Mercosur, Uruguay pretendía ver anulados los efectos de norma brasileña que prohibía la importación por aquel país de neumáticos remoldeados. Tal como en la presente controversia, Uruguay alegaba, entre otros, los argumentos de prioridad de las normas del Mercosur para garantizar el libre comercio, del comportamiento previo del Brasil que admitía la importación de tales productos, para posteriormente prohibirla, y además la aplicación del principio de estoppel.
  10. Cesan en este punto las semejanzas entre aquella decisión y lo que se discute en este arbitraje. En aquella oportunidad, el Tribunal Arbitral, por unanimidad, dio la razón al Uruguay, determinando que el Brasil reformulase su legislación interna de forma a readmitir la importación de neumáticos Una lectura cuidadosa del laudo arbitral dictado en enero de 2002 indica que el Tribunal, en aquella oportunidad, se preocupó exclusivamente en verificar si el comportamiento de Brasil implicaba (o no) violación al principio de libre comercio. Se preocupó igualmente el Tribunal en analizar si el flujo comercial del producto existía y era substancial. Se preocupó el Tribunal en comprobar si había por parte del Brasil una práctica comercial injustificadamente interrumpida, afectando el principio de libre comercio que debe estar protegido contra restricciones no económicas. En base en estas preocupaciones, el Tribunal dictó su decisión.
  11. No hay, sin embargo, en todo el laudo arbitral cualquier preocupación con la preservación del medio ambiente. No se cuidó el Tribunal de analizar las excepciones al principio de la libre competencia fundadas en la protección de la vida y la salud de las personas, de los animales y de los vegetales. No se preocupó el Tribunal en analizar los principios de derecho internacional, ni tampoco los específicos de Mercosur, que autorizarían a relativizar las normas comerciales y económicas en nombre de un ambiente más sano para la región. En ningún tópico de aquella decisión arbitral se mencionó, por ejemplo, el artículo 2º del Anexo I al Tratado de Asunción aún el artículo 50 del Tratado de Montevideo de 1980, marcos jurídicos de importancia fundamental en el deslinde de este actual arbitraje.
  12. Aquí, además de las inherentes discusiones sobre la libertad de comercio y los principios y normas que aseguran el libre comercio en el Mercosur, las Partes y, más particularmente, la Argentina, presentaron datos, hechos y argumentos directamente relacionados con el Derecho Ambiental. Se discutió hasta el agotamiento la durabilidad de los neumáticos remoldeados y – en consecuencia – el tiempo al final del cual serán transformados en residuos peligrosos, tal como todos los neumáticos El tema de preservación ambiental fue contrapuesto al de libre comercio. Así, al contrario del caso referido, este Tribunal no puede ignorar la importancia e impacto de los argumentos de naturaleza ambiental. No sólo no ignoró la relevancia de tales aspectos jurídicos, como los consideró suficientes para atemperar y relativizar el principio de la libre circulación de bienes y servicios, admitiéndose como excepción justificada a su plena aplicación. De esta forma, el referido fundamento jurisprudencial, tal como fue propuesto, no es aplicable a este caso.
  13. Restan, a su vez, breves y últimas consideraciones sobre dos aspectos levantados por el Uruguay en este Menciona que habría habido una discriminación comercial por parte de la Argentina, pues, ya en la vigencia de la Ley Nº 25.626, habrían ocurrido importaciones de neumáticos remoldeados de otros orígenes. Argentina refutó la alegación, admitiendo el acontecimiento de importaciones temporarias de tales productos en cantidades insignificante y exclusivamente para experimentos y análisis. Adjuntó documentos en ese sentido y la versión presentada no fue contestada. En cuanto a la existencia de innumerables fábricas argentinas dedicadas a la reconstrucción de neumáticos, el argumento no afecta la decisión de este Tribunal al reconocer que neumáticos remoldeados en el propio país reducen la aceleración del pasivo ambiental, en tanto que la importación de tales productos, en particular ante el hecho de su vida útil reducida, incrementan tal pasivo
  14. DECISIÓN

Por todo lo expuesto y por lo demás que de este proceso consta, de conformidad con el Protocolo de Olivos, con las normas y principios jurídicos aplicables a la materia y, en los términos de las Reglas de Procedimiento aprobadas el 19 de agosto de 2005, este Tribunal Arbitral Ad Hoc constituido para conocer y juzgar la controversia involucrando a la República Oriental del Uruguay y la República Argentina sobre “Prohibición de Importación de Neumáticos Remoldeados” D E C I D E:

  1. Por mayoría de votos de los Señores Árbitros, que la Ley Nº 626, promulgada por la República Argentina el 8 de agosto de 2002 y publicada en el Boletín Oficial, el 9 de agosto de 2002, es compatible con lo dispuesto en el Tratado de Asunción y su Anexo I, con las normas derivadas de tal Tratado, así como con las disposiciones de Derecho Internacional aplicables a la materia.
  2. Por unanimidad, determinar, en los términos del artículo 36.1 del Protocolo de Olivos, que los costos y desembolsos de este procedimiento arbitral sean pagados y reembolsados a la Secretaría Administrativa del Mercosur, conforme el caso, de la siguiente manera: (a) cada Parte arcará con los costos y desembolsos del árbitro por ella indicado, así como con los costos y desembolsos de los representantes, asesores y peritos por ella respectivamente nombrados o indicados; (b) los costos y desembolsos incurridos con y por el Presidente del Tribunal serán pagados en partes iguales pelas Partes; (c) las Partes dividirán igualmente entre si todos los costos y desembolsos, inclusive de naturaleza administrativa, incurridos por la Secretaría Administrativa del Mercosur en la organización y conducción de este proceso. Los pagos y reembolsos de costos y desembolsos, en la forma aquí definida, deberán ser efectuados por las Partes correspondientes directamente a la Secretaria Administrativa del Mercosur, dentro del plazo improrrogable de 30 (treinta) días contados a la notificación del Laudo.
  1. Por unanimidad autorizar a la Secretaría Administrativa del Mercosur a efectuar, de inmediato, todos los pagos aún pendientes y relativos al presente proceso, en los términos de la decisión adoptada, con recursos disponibles del Fondo Especial, debitándolos a las Partes en las proporciones aquí determinadas.
  2. Por unanimidad determinar que los autos y todos los documentos relativos al presente proceso permanezcan archivados en la Secretaría Administrativa del Mercosur.

Por unanimidad declarar que, exceptuándose lo dispuesto en los artículos 28.1 y 17 del Protocolo de Olivos, lo dispuesto en este Laudo es obligatorio para las Partes y tiene efecto inmediato, de conformidad con lo que determinan los artículos 26 y 27 del mismo Protocolo.

Sean las Partes notificadas de esta decisión por intermedio de la Secretaría Administrativa del Mercosur, desde luego por copias y correspondencia electrónica, esta última, si es posible y, en secuencia, con el documento oficial. El presente Laudo Arbitral es redactado en portugués, debiendo la Secretaría Administrativa del Mercosur, para mayor comodidad y facilidad de las Partes, providenciar, en el menor plazo posible, su traducción para el idioma Español. La versión en Portugués del Laudo Arbitral será la única oficial y prevalecerá sobre la traducción en Español, que, por su carácter no-oficial, no será revista o autenticada por los Árbitros.

Publíquese.

José María Gamio

Árbitro

Marcelo Antonio Gottifredi

Árbitro

Hermes Marcelo Huck

Árbitro Presidente