Detention, a sobre-estadia de contêiner na expotação – a evolução do tema no âmbito judiciário (TJSP) e administrativo (ANTAQ) – Ad. Marcel Nicolau Stivaletti (desde Brasil)

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No último dia 01/06, na sede da RMM | Advocacia Ruy de Mello Miller, promovemos uma palestra sobre tema sensível e atual na dinâmica do transporte marítimo: a sobre-estadia de contêiner.

Iniciei minha exposição apresentando recurso julgado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) em 2017, apontando quão distante o judiciário ainda estava da correta compreensão do tema. Àquela ocasião, chamava atenção a clara confusão conceitual entre demurrage (sobre-estadia na importação) e detention (sobre-estadia na exportação). Além disso, com base no mesmo julgado, registramos algo que era comum à falta de uma normatização específica: a condenação do usuário do contêiner com base, tão somente, nos “usos e costumes do direito marítimo”.

O tratamento do tema passou a mudar, à medida que a ANTAQ – Agência Nacional de Transportes Aquaviários – editou a Resolução Normativa nº 18, nos idos de 2017. A edição dessa norma – ora substituída pela Resolução nº 62/2021, mas sem lhe alterar a essência – representou verdadeiro divisor de águas, mormente por ter estabelecido marcos temporais delimitadores da responsabilidade do usuário do equipamento de transporte.

Na palestra em tela focamos na detention (sobre-estadia na exportação) e, de início, na demarcação estabelecida pela Agência Reguladora. A rigor, nos termos da norma, a responsabilidade do embarcador se exaure com a entrega do contêiner no terminal de embarque. Pode o exportador responder depois desse momento (entrega/terminal)? A resposta é afirmativa, desde que o próprio exportador tenha dado causa ao prolongamento da estada do contêiner no terminal de embarque.

Por consequência, figurando no ordenamento jurídico norma específica cuidando da sobre-estadia de contêiner, naturalmente processos administrativos começaram a emergir no âmbito da Agência Reguladora do setor aquaviário.

Num dos casos apresentados na palestra, o exportador, com o contêiner apto para entrega no terminal de embarque, não o fazia por restrições operacionais do navio. A diretoria colegiada da a Agência Reguladora depreendeu, com acerto, que qualquer causa atribuível ao armador tem o condão de suspender a contabilização da sobre-estadia, inteligência do artigo 21, §2º, Resolução nº 62/2021.  Em sede liminar, a ANTAQ determinou a suspensão da cobrança e, no mérito, ordenou a abertura dos procedimentos de fiscalização em detrimento do transportador.

Encerramos nossa parte na apresentação mostrando a mudança de rumos havida no Tribunal de Justiça de São Paulo. Se aquele primeiro julgado indicava certa distância do tema, o último mencionado na exposição aponta para uma clara aproximação com a ANTAQ, órgão administrativo e técnico do setor.

Nesse acórdão, da lavra do TJSP, podemos ver a compreensão sobre os marcos temporais delimitares da cobrança. Ou seja, não há que se considerar a data do embarque como marco final da cobrança, mas sim o momento em que entregues os contêineres no terminal. Do momento da entrega em diante, caberia ao armador mostrar que o exportador deu causa ao prolongamento da estada do contêiner no terminal. É o que também salienta a relatora do acórdão, impondo ao armador o ônus da prova nesse sentido. Noutras palavras, restou evidenciado que a decisão judicial se escudou na norma técnica editada pela Agência Reguladora (Resolução nº 62/2021).

Por fim, saliento que o caro leitor do portal Mercojuris poderá acessar o link abaixo para assistir a íntegra da palestra. Além da minha apresentação, o evento contou com o Dr. Rafael Ferreira (sócio na Advocacia Ruy de Mello Miller), que teceu abalizados comentários sobre recente decisão proferida pela ANTAQ, no âmbito do tema 2.2 da Agenda Regulatória 2020/2021, cujo objeto era a determinação de uma metodologia para se apurar a abusividade nas cobranças pela sobre-estadia de contêiner.

O encontro ainda contou com a valiosa participação de Lucas Moreno, fundador da Ellox Digital, que ponderou a importância do tratamento dos dados pelos usuários, de modo a possibilitar a defesa de direito eventualmente lesado nas cobranças pelo uso do contêiner.

Ad. Marcel Nicolau Stivaletti

Junio 2.023

https://www.youtube.com/watch?v=6rAVI8cb_go